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sábado, 18 de fevereiro de 2012

O Super-Herói em 24 quadros por segundo – Parte 1 de 4

Por Édnei Pedroso - O Café
IDENTIDADE SECRETA


O cinema atual (mais precisamente do ano 2000 em diante), segue enriquecendo cada vez mais em sua estrutura e técnica (3D, hello!), contudo, parece estar em um grande declínio em relação a idéias e plots. Quem gosta do assunto e sempre esperou o verão americano com aquela ansiedade cinéfila das estréias dos grandes filmes, já perdeu as esperanças e não vê, a médio prazo, algum filme que seja realmente instigante de se esperar. Para sanar este hiato criativo, um dos portos seguros mais utilizados atualmente pelos estúdios é a adaptação de livros, contos e HQs, afinal, uma idéia já testada e aprovada tem uma possibilidade maior de dar certo. Dentro dessas mídias, podemos combinar que poucas coisas mexem tanto com o imaginário popular quanto a figura do super-herói.

Superman, por Alex Ross.

Como o título do texto sugere, este é o primeiro de alguns ensaios onde pretendo abordar a trajetória desta figura mítica no mundo da sétima arte e, como o título também sugere, em cada texto falarei de um aspecto específico do super-herói cinematográfico (gostem ou não, uma vez que o personagem passou para o lado de lá da tela, aquele herói específico pertence ao cinema; por isso é importante fazermos distinções do “Batman do cinema” para o “Batman dos quadrinhos”, por exemplo – um é adaptação do outro, mas trata-se de dois universos distintos – uma realidade paralela, se preferirem).

O Batman de Christopher Nolan com roupa de borracha e aparatos de montanhismo: mais próximo da realidade que sua contra-parte dos quadrinhos.
Para começar, é acertado fazer uma breve introdução ao tema, que tem sua origem desde que o homem descobriu que sabia contar histórias: inicialmente na cultura e na religião (através de profetas e semideuses, sendo Hércules o mais famoso desta última leva), depois em mil exemplos da literatura universal (onde os personagens eram capazes de proezas sobre-humanas como, por exemplo, andar sobre a água), passando pelos contos e causos (encarregados de anabolizar a verdade, até torná-la “lenda”), os super-heróis chegaram na expressão máxima do termo como o conhecemos hoje ao figurar nos primeiros pulp fictions e nas primeiras histórias em quadrinhos (inclusive, a expressão “super-herói” propriamente dita só começou a ser usada após o advento do Super-Homem, em 1938).

Action Comics Nº 1: onde tudo começou.
Junto deste fenômeno cultural, nasceu o que podemos considerar o maior dilema e motivação de quase todos os acontecimentos relacionados ao super-herói moderno: a identidade secreta. A máscara, além de sugerir um enigma, protege o lado mais fraco do herói, juntamente com todas as pessoas que fazem parte do seu dia-a-dia quando não está combatendo o crime. Esta premissa, parte integrante de quase todas as HQs de heróis, acaba rendendo todo o arco e plot-points necessários para a maioria dos filmes de sucesso que contenham esses seres como protagonistas.
As sinopses dos filmes de super-heróis (assim como as de qualquer filme de qualquer temática) normalmente se originam de um objetivo ou ameaça (geralmente caracterizada por um vilão), mas é a identidade secreta, e a necessidade de mantê-la a todo custo, que impulsiona uma boa história de super-herói. Podemos ver esse exemplo na franquia do Superman iniciada pelo diretor Richard Donner, onde o personagem possui uma necessidade constante de se esconder por trás de um par de óculos e do andar desajeitado de Clark Kent (nas HQs é quase a mesma coisa, porém, o risco da descoberta nos aparenta muito maior na tela com os enquadramentos e feições dos atores e atrizes, do que nas páginas). Vemos a mesma coisa na franquia do Homem-Aranha dirigida por Sam Raimi (onde vemos o pavor do jovem Peter Parker só de pensar em ser descoberto, sendo que há o acréscimo do vilão da história ser sempre alguém próximo a ele), ou nos filmes do Batman, onde o personagem deve manter a vida dupla de vigilante e milionário, para não dar na vista. A identidade secreta, e toda sua carga dramática, é uma das maiores armas para garantir o sucesso de um filme de super-herói, ou mesmo de um seriado (vide Smallville, que já perdeu tudo de bom que um dia já teve, mas mantém-se no ar com boa audiência há 10 anos, apenas com o plot da identidade secreta como alicerce).

Identidade secreta: o grande dilema de Peter Parker.


“Mas isso quer dizer que filmes onde o super-herói não esconde o rosto dão errado?”

Sim e não. O fato é que o risco de um filme sem a prerrogativa da identidade secreta afundar é bem maior do que um filme com mascarados, pois há poucas possibilidades de exploração do roteiro. Heróis como o Quarteto Fantástico (que não escondem a identidade) ou o Wolverine (que quase nunca precisa esconder quem é), por exemplo, afundaram feio nos cinemas por terem de se manter apenas com o plot da ameaça (isso só funciona sozinho se o argumento for MUITO bom ou se o diretor e equipe criativa forem MUITO competentes, o que não era o caso de nenhum dos dois filmes) . O grupo liderado pelo Sr. Fantástico até tem a desculpa de não ser tão conhecido do grande público, já o mutante daMarvel vinha de uma trilogia de filmes de sucesso (X-Men) e fracassou miseravelmente no filme solo. OHulk, com toda sua tendência psicológica e seus efeitos mirabolantes em CGI, também passou pelo mesmo problema. É claro que toda regra tem uma exceção, e o Homem de Ferro, de Jon Favreau, não me deixa mentir (não é surpresa pra ninguém que Tony Stark é o Homem de Ferro, e o fato de todos saberem disso é, inclusive, o grande mote do segundo filme).

Homem de Ferro: filme de sucesso e exceção da regra.
“Mas isso quer dizer que filmes com mascarados sempre dão certo?”
Nem sempre, mas a possibilidade de fracassar é consideravelmente menor. Os filmes do Batmandirigidos por Joel Schumacher, por exemplo, caracterizam tudo que um cineasta não deve fazer com um super-herói, provando que identidade secreta não é garantia absoluta de sucesso. Outro ótimo exemplo é Watchmen, de Zack Snyder, adaptação da obra-prima de Alan Moore que traz um grupo de ex-heróis mascarados sendo caçados um a um. Embora o longa seja um belo exemplar de filmes de super-heróis (meretrizes de Alan Moore, xinguem-me) e tenha como mote principal a manutenção da identidade secreta, há tantos outros plots no filme que acabam por confundir o grande público, e desagradando a maioria das pessoas que eram fãs da Graphic Novel.
Abaixo, você pode conferir o diretor Schumacher pedindo desculpas pelo filme Batman e Robin.


Nos próximos meses, teremos várias adaptações de HQs de super-heróis pintando na tela. Lanterna Verde, filme do diretor Martin Campbell que tem lançamento previsto para meados de 2011, contará a trajetória de Hal Jordan (Ryan Reynolds) até se tornar o mascarado guerreiro esmeralda. Já O Poderoso Thor, de Kenneth Branagh, nos trará o deus nórdico em uma aventura de descobrimento que promete revolucionar o gênero cinematográfico, mas sem máscara. E teremos o filme do Capitão América, onde eu realmente não sei como será abordada esta faceta, mas sei que Chris Evans, o ator que interpretará o bandeiroso, costuma ser bastante pé frio quando se trata de participar de uma adaptação (Quarteto Fantástico e Scott Pilgrim Vs. o Mundo que o digam).

Lanterna Verde: a adaptação mais aguardada de 2011.
Identidades secretas são cruciais, fazem parte da essência do super-herói em todas as mídias. Assim como o uniforme é um símbolo a ser seguido e a capa transmite a sensação de poder, a máscara mantém o super-herói intocável, longe da corrupção e da influência do mundo que ele deve proteger. Ela confere ao personagem o dilema do segredo, uma fraqueza, um passo que o aproxima e o identifica com quem realmente importa em toda essa equação: os fãs.

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