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segunda-feira, 18 de julho de 2011

Traços pioneiros

Por Diário do Nordeste
Biografia de Angelo Agostini e coletânea do personagem Garra Cinzenta recuperam momentos cruciais da história da nova arte no Brasil, país com vocação antecipatória
 A história dos quadrinhos é um território disputado, à moda antiga, por candidatos a fundadores disso e a pioneiros daquilo. Os norte-americanos, claro, reivindicam a criação da linguagem, com seu personagem Yellow Kid, de 1895, tendo que enfrentar argumentos e provas irrefutáveis dos alemães e dos suíços. A novidade nisso é saber que o Brasil também seu ás na manga.

E é aí que reside a natureza paradoxal dos quadrinhos nacionais. É inegável que as HQs brasileiros vivem, talvez desde sempre, em permanente crise (estética, de identidade e financeira). Da mesma forma, é quase impossível questionar nossa vocação para o pioneirismo.

"Angelo Agostini", de Gilberto Maringoni, trata do marco zero desta estranha vocação de se antecipar. O artista que dá título à obra é um italiano, que radicou-se no Brasil ainda adolescente e fez carreira na imprensa carioca e paulista, na segunda metade do século XIX. Só que chargista tinha também dotes de contador de histórias. Com os personagens Nhô-Quim e Zé Caipora, criou o que historiadores consideram a primeira HQ, ainda em 1869, portanto, pelo menos 26 anos antes do marco zero proposto pela tese norte-americana.

A pena afiada
Em 2009, Angelo Agostini (1843-1910) havia ganhado um estudo vigoroso, que o interpretava como satirista - "Poeta do Lápis: sátira e política na trajetória de Angelo Agostini no Brasil Imperial (1864-1888)", de Marcelo Balaban. O livro de Maringoni tem o recorte mais abrangente. Investiga a produção do artisa não apenas a partir de seu significado, mas da maneira como produzia.

Como em boa parte dos estudos sobre a atuação do italiano, a condição de pioneiro das HQs é deixada de lado (afinal, a discussão fede a uma historiografia caduca). Contudo, ao apresentar a trajetória de Agostini, no contexto das transformações da chamada imprensa ilustrada (onde o texto era adereço de imagens, em geral, críticas de natureza política), o autor dá pistas dos elementos que possibilitaram a aparição de uma nova linguagem, composta de traços e letras, que viria a ser chamada de HQs.

O herói pulp
 
Ouro registro da agilidade com que o Brasil respondeu ao imperativo dos quadrinhos é "Garra Cinzenta". Álbum de luxo editado pela Conrad, ele reúne as aventuras completas do Inspetor Higgins para frustrar os planos do misterioso Garra Cinzenta e seus comparsas, a Dama de Negro e o androide Flag. Publicadas entre 1937 e 1939, em "A Gazetinha", periódico do jornalista Cásper Líbero, as histórias recriavam o universo noir das narrativas policiais norte-americanas, que chegam ao público através do cinema e de quadrinhos.
É curioso que, neste caso, o Brasil tenha pegado rápido o espírito da coisa. Afinal, o Garra Cinzenta trazia elementos que se tornaram célebres em clássicos como O Sombra, Dick Tracy e Batman (em seus primeiros e detetivescos anos). O volume só não desfaz o mistério: quem seria o autor Francisco Armond, criador das histórias do volume, que se escondia por trás deste pseudônimo.

Quadrinhos Garra Cinzenta Francisco Armond e Renato Silva Conrad
2011
128 páginas
R$ 39,90

História Angelo Agostini Gilberto Maringoni
Devir
2011
256 Páginas
R$ 39,50

DELLANO RIOSEDITOR

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