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domingo, 25 de dezembro de 2011

Os contos de Natal do Super-Homem

Por Omelete
Super-heróis e histórias natalinas, como veremos a seguir, combinam perfeitamente. Aproveitando a data anteriormente utilizada para festas pagãs, o Natal é a festividade máxima do Cristianismo, por celebrar o nascimento de seu Salvador. Além disso, consegue superar barreiras decorrentes de crenças religiosas e extrair o melhor do ser humano. Numa época recheada de incertezas e dominada pelo caos global, todavia, valores altruístas são colocados em xeque, e no mundo dos quadrinhos, os próprios super-heróis parecem ter perdido o rumo nos últimos anos. Busquemos, então, contos de Natal protagonizados pelo Super-Homem ao longo de diferentes épocas. Certamente, não teríamos opção melhor que o Último Filho de Krypton, ele próprio um salvador enviado para inspirar a bondade presente no coração dos homens.


"Christmas ‘Round the World" foi publicada em 1946, na revista Action Comics 93, escrita por Don Cameron e ilustrada por Ira Yarbrough e Stan Kaye. O conto da Era de Ouro dos quadrinhos começa com Clark Kent e Lois Lane celebrando o Natal em Metrópolis, na companhia de crianças refugiadas de diferentes países. Logo surge o conflito: os jovens pensam nos pais, e Jon Bjornsen, o enviado da Noruega sente falta do filho Eric, perdido desde que os nazistas destruíram sua cidade. Com o auxílio de jatos da Força Aérea Americana, o Super-Homem decide levar as crianças para suas cidades, em países como Rússia, China e Holanda, chegando até a trajar o manto de Papai Noel numa ocasião. Tudo parecia bem, até o momento em que o Super-Homem encontra Eric, e este afirma não ter a vontade de encontrar o pai, preferindo comemorar o Natal com os amigos. Quando, enfim, ocorre o reencontro entre pai e filho, a explicação do garoto é comovente. Eric não desejava estragar o Natal dos amigos, que haviam perdido os pais. Apesar da simplicidade narrativa característica dos anos 1940, a história de Cameron é eficiente e relevante, pois trata muito bem dos efeitos da Segunda Guerra Mundial sobre as famílias do mundo inteiro, de valores universais e, naturalmente, do papel do Super-Homem. Para fechar com chave de ouro, Clark rouba um beijo de Lois sob o visco!

Em março de 1984, a revista DC Comics Presents 67, que apresentava encontros do Super-Homem com outros super-heróis do Universo DC, teve um convidado muito especial: ninguém menos que Papai Noel! "‘Twas the Fright Before Christmas", escrita pela dupla Len Wein e E. Nelson Bridwell, com arte de Curt Swan e Murphy Anderson, começa com o Super-Homem investigando uma criança que havia sido hipnotizada por seu tradicional inimigo - o Homem dos Brinquedos -, equipada com uma perigosa arma de brinquedo, e programada para roubar. Usando a hipnose, o Super-Homem descobre que inúmeras armas foram produzidas, e a noite de natal seria cheia de crianças sob o controle mental do bandido. Após um confronto, o Homem de Aço é abatido pelo dispositivo gravitacional do vilão, fruto de matéria de uma estrela anã branca, e acorda no Pólo Norte, resgatado pelo Papai Noel. A reunião da dupla improvável constitui um momento de pura magia, compensando a pouca credibilidade que os leitores modernos dariam a tais idéias. Após a inevitável derrota do Homem dos Brinquedos por Kal-El e Kris Kringle, e dos brinquedos malévolos recolhidos, mais um momento de destaque. Incerto sobre a veracidade dos eventos, Clark Kent encontra em seu apartamento algo familiar e há muito perdido, um brinquedo de sua infância em Krypton, que projeta então a imagem do Papai Noel desejando-lhe um Feliz Natal.

Seguindo a reformulação de John Byrne, decorrente da saga "Crise nas Infinitas Terras", a cronologia do Super-Homem recomeçou do zero em prol de um herói mais humano e de maior apelo. Embora muito tenha se perdido, excelentes histórias de Natal foram narradas no período. "Noite de Paz", de Roger Stern e Dan Jurgens foi publicada pela Editora Abril em Super-Homem 96, de junho de 1992. Num dos pontos altos das equipes criativas da época, Clark Kent estava sob a influência do Erradicador, o artefato kryptoniano que tentava incutir-lhe uma mentalidade lógica e sem emoções. Por isso, ele estava trocando seu cargo de jornalista no Planeta Diário pelo de editor da revista Newstime. Ainda assim, o elemento humano prevalecia. No começo da história, o Super-Homem ajuda um grupo de operários na construção de um edifício. Depois, Clark ganha uma festa-surpresa de seus colegas de jornal. No entanto, o ponto surpreendente da história acontece quando ele descobre que a jovem Alice estava morando secretamente no prédio do Planeta Diário, sem condições de vida digna e com a mãe internada. Tocado pelo drama de sua funcionária, o editor-chefe Perry White e sua mulher decidem adotá-la. Fechando o conto, temos a celebração de Clark com os pais e Lana Lang, em Smallville. E numa sacada brilhante, trechos de um editorial de Perry White sobre o potencial que cada pessoa tem de ajudar o próximo, seja qual for a dificuldade enfrentada, com imagens realmente poderosas.


Dan Jurgens retorna em uma de suas histórias mais elogiadas, "O Correiro de Metrópolis", ilustrada por Jackson Guice, que saiu no Brasil em Liga da Justiça Internacional 67 (o último número da publicação), de julho de 1994. Logo ficamos sabendo que no dia 23 de dezembro de cada ano, o Super-Homem passa a noite no Correio de Metrópolis, lendo as cartas de pessoas que lhe escreveram pedindo ajuda. Como muitos são interesseiros querendo lucrar, e outros pedem o impossível, o herói sente-se desconfortável com a situação. Em muitos casos, porém, sua ação é imediata. Atendendo o pedido de uma sobrevivente de Auschwitz, o Super-Homem encontra sua irmã perdida há décadas na antiga Alemanha oriental, reunindo uma família. Na situação seguinte, encara sua própria impotência diante do destino humano quando vai visitar um menino cujo pai sofria com um tumor cerebral. Ao chegar, o homem já havia falecido. Como a família autoriza a doação de órgãos, entretanto, uma outra vida é salva. Finalizando, o Super-Homem anima a festa de Natal de crianças desamparadas promovidas pelo Planeta Diário, com os presentes financiados por um certo Bruce Wayne. A seqüência "O Correio de Metrópolis 2" foi publicada no período em que o Super-Homem estava morto, na minissérie "Funeral para um Amigo", estrelada pela Liga da Justiça. Um fato curioso é um dos personagens ajudados, vítima da luta do Super contra o Apocalypse, posteriormente ter-se tornado um super-herói da equipe os Super-Homens da América. É por histórias assim que o autor merece ser lembrado.


Na história tripla "Sombras", publicada em Super-Homem - Segunda Série 6, de abril de 1997, os sucessores de John Byrne já estavam com idéias desgastadas, perdendo-se em eventos redundantes como, no caso, o prelúdio de "A Morte de Clark Kent". Ainda assim, os roteiristas Karl Kesel e novamente Dan Jurgens conseguiram tirar leite de pedra nas últimas histórias de Natal dessa fase do personagem. Na primeira parte, escrita e desenhada por Jurgens, temos o Super-Homem realizando uma tarefa inesperada. Após desobstruir uma ponte acidentada, é chamado para ajudar uma mulher que estava prestes a dar à luz. Chegando no momento exato, nosso herói realiza o parto com sucesso! A segunda parte conta com texto de Kesel e desenhos de Stuart Immonen. Clark buscava uma boneca Debbi - a moda da vez - para dar de presente à sua amada. Enquanto isso, exatos 100 super-vilões executavam o plano de assaltar diversos pontos de Metrópolis à meia-noite. Entre os meliantes, tipos conhecidos como Os Intocáveis, Brecha, Capitão Bumerangue e a Gangue de Espadas. Embora não constitua exatamente uma exploração do espírito natalino, a narrativa foi divertida, sem grandes pretensões, típica do roteirista Karl Kesel. No final, o kryptoniano enfrenta Pierrô e Colombina na principal loja de brinquedos da cidade. E adivinhe que boneca ele acaba ganhando?


Em 1999, os roteiristas Jeph Loeb e Joe Kelly foram encarregados de revigorar os títulos da linha Superman nos Estados Unidos, trazendo de volta a sensação de grandeza, a criatividade da Era de Prata e elementos da mitologia pré-Crise que haviam sido perdidos. "All I want for Christmas", foi publicada em dezembro de 1999 na edição Action Comics 762, e contou com texto de Joe Kelly e arte de Kano e German Garcia. No conto, Lois desafia Clark a comprar um presente numa loja comum, sem usar superpoderes. Numa loja lotada, cruza o caminho do demônio Etrigan e da vilã Encantadora. Através da névoa mágica da criminosa, o Demônio transforma cada pessoa em sua auto-imagem negativa. A vitória do Super-Homem decorre de sua esperança e fé em tudo o que há de mais belo e justo na humanidade, quando ele aspira toda a névoa e a semeia entre o povo. Em abril de 2002, foi publicada na edição nacional Superman 19 a história "Socorro", de Jeph Loeb, que servia de prelúdio para a megassaga "Mundos em Guerra" e mostrava as conseqüências da vitória de Lex Luthor nas eleições presidenciais. Enquanto o Super-Homem se encontrava com os integrantes da Liga da Justiça para dar-lhes seus presentes de Natal, discutiam o sistema eleitoral e a situação política da nação. Para cada heróis da Liga, a história contou com um desenhista diferente, entre os quais estiveram Arthur Adams, Rob Liefeld e Joe Madureira. Longe de estar entre os melhores trabalhos do autor, ao menos combina cenas bem-humoradas com um dos temas de maior repercussão e ousadia dos últimos tempos.


Independente do período histórico, de ideologias políticas ou crenças religiosas, notamos nos contos de Natal do Super-Homem uma valorização de sentimentos que, muitas vezes, deixamos de lado. Jerry Siegel e Joe Shuster foram abençoados ao presentear o mundo com um herói universal, atemporal, de ressonância indelével, um alienígena superpoderoso perdido na Terra, que se destaca por sua humildade, perseverança, crença na verdade e na justiça; e sobretudo, por um verdadeiro amor incondicional pela humanidade. Um ideal que está ao nosso alcance, se apenas nos esforçarmos para conquistá-lo. Então é Natal, e não podemos mover planetas ou parar uma locomotiva, mas podemos expressar a compaixão característica do Último Filho de Krypton. Mesmo que seja apenas em palavras ou gestos aparentemente pequenos, qualquer pessoa pode fazer a diferença.


A todos, um Feliz Natal! E que o super-herói em cada um jamais desista de lutar.

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