quinta-feira, 30 de março de 2017

Xilogravura e mangá

Uma conversa entre as duas artes.
Muitos pesquisadores de mangá marcam a arte emakimono (rolo de pintura) e as xilogravuras japonesas como sendo início da arte do mangá.
Comentaremos especificamente sobre a xilogravura japonesa e sua relação com o mangá. Porém, antes de tudo, é necessário explicar brevemente o que é xilogravura japonesa.

Esta arte migrou da China para o Japão, no século VIII, com o propósito de distribuir os escritos Budistas nos templos. No século XVI e XVII a xilogravura se tornou um meio para divulgar o ukiyo-e (“pintura do mundo flutuante”). Conhecida como mokuhanga (木版画), esta técnica inicialmente imprimia somente preto e branco e as cores eram feitas manualmente. Em meados do século XVIII que a impressão passou a ser policromia. Cabe ainda observar que a maneira que a xilogravura era e é retratada no ocidente é diferente da japonesa, enquanto no ocidente existe o contorno e as hachuras para representar luz e sembro e volume, no Japão, são apenas as linhas grossas e finas dos contornos que criam a figura.
Um dos mais renomados artistas da xilogravura japonesa é Katsushika Hokusai (1760 – 1849). Hokusai, como é conhecido no Japão e no mundo, teve em vida pelo menos 30 nomes diferentes, tradição comum na cultura japonesa. Suas obras influenciaram os artistas franceses do século XIX, como os impressionistas e a art nouveau, além de artistas do mangá. A principal importância de Hokusai para o mangá foi o termo, que significa “desenho cômico”.
Hokusai_portrait
Autoretrato de Katsushika Hokusai
Uma de suas maiores obras consiste em uma coleção de 15 volumes, um livro repleto de quase 4.000 esboços que foi publicado em 1814 e denominado de Hokusai Manga. Estes esboços são de animais, de pessoas do cotidiano, construções, de objetos e, inclusive, do sobrenatural. Estes volumes foram muito importantes tanto para o artista quanto para seus discípulos que usufruíam dos estudos de Hokusai para se aprimorarem, além é claro, de conquistar novos artistas discípulos.

Hokusai_vol_1a
Volume 1: cenas da vida cotidiana

Além do termo mangá, uma das aproximações que podemos fazer entre os quadrinhos japoneses e a xilogravura japonesa (e ukiyo-e), são as divisões temáticas que apresentam. Por exemplo, no primeiro temos: shôjo (menina adoslecente), shônen (menino adolescente), gekiga (pintura dramática), mecha (ficção científica, robôs e máquinas), yaoi (narrativas relacionadas a homossexualismo), hentai (pornográfico e erótico) etc; e no segundo temos: bijinga (“figura bonita”), meisho-e (“pinturas de vistas-famosas”), yakusha-e (“pintura de atores de kabuki”), shunga (“pintura erótica”) etc.
Outra relação é o enquadramento das cenas. Os artistas impressionistas já haviam se encantado com os cortes das figuras que os artistas japoneses fazem nas suas obras. Eles não representam a figura completa no espaço a ser produzido, e sim, como nosso olhar vê a realidade, característica também encontrada nos enquadramentos de cena dos mangá, principalmente os shôjo mangá. A composição é dinâmica, pois há a presença da diagonalidade, dos espaços cheios e vazios, ausência de simetria e equilíbrio, a perspectiva normalmente se dá pelo ângulo do “olho de pássaro”.
Encontramos a imagem bidimensional na maioria das xilogravuras e as imagens raramente possuem claro e escuro, apenas uma representação de luz e sombra em alguns momentos, assim como nos mangás em que as retículas produzem o mesmo efeito.
As linhas também se assemelham, pois o desenho é feito com pincel no papel antes de ser transpassado para a madeira (matriz), e o corte na matriz permanece a linha original do artista, permitindo que as linhas sejam grossas e finas. No mangá o efeito é o mesmo, mas os artistas procuram usar o pincel ou o bico de pena. Em ambas as artes, essas linhas não são o limite para as cores ou retículas, elas não necessariamente respeitam essa delimitação.
Outra conversa que as duas artes podem ter é sua popularização. As xilogravuras, por poderem ter várias impressões, eram comercializadas de forma barata e em grande escala, assim como é a indústria do mangá. O objetivo não é restringir o público, e sim, ampliá-lo.
Estas são algumas aproximações possíveis que encontramos nas xilogravuras japonesas e nos mangás, de duas artes que são apreciadas pelos japoneses e também populares e reconhecidas no ocidente.

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