segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

As artes de Alceu

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Em "Alceu Penna e As Garotas do Brasil", o jornalista Gonçalo Junior, conta a história do multi- artista mineiro, um pioneiro da alta costura no Brasil e clássico das HQs
O mineiro Alceu Penna (1915 - 1980) é um daqueles personagens de vida ímpar. Sua trajetória de vida parece ter sido traçada com talento literário por um autor imaginativo. Parecia estar sempre no lugar certo, na hora precisa. Não apenas fez história, como ajudou outros a fazê-las. E para dissipar o suspense, cito credenciais tão díspares quanto a do pioneirismo na alta-costura, a contribuição para o estabelecimento da icônica imagem de Carmen Miranda e criação de um novo tipo de histórias em quadrinhos no Brasil.


O enredo detalhado pode ser encontrado em "Alceu Penna e as Garotas do Brasil - Moda e imprensa - 1933 a 1975", do jornalista e pesquisador Gonçalo Junior. O livro acaba de chegar às livrarias, pelo selo Amarilys, da editora Manole. A obra é a versão ampliada do livro homônimo, lançado pela editora Cluq (especializada em HQs), em 2004. "Era quase um fanzine. Uma edição de umas 140 páginas, com apenas 500 cópias. Acabou sendo vendido só em São Paulo", conta Gonçalo Junior.


Apesar da timidez do primeiro projeto, ele foi capaz de chamar a atenção de pessoas próximas do biografado. "Não sei como ficaram sabendo, mas, de repente, várias pessoas, inclusive da família do Alceu, me procuraram. Alguns nomes da cúpula de ´O Cruzeiro´ (importante publicação onde Penna publicou alguns de seus trabalhos mais famosos) me escreveram, pessoas de idade já bem avançada que mandaram cartas, e-mails. Acabei ´engordando´ o livro em mais 200 e poucas páginas", relembra Gonçalo.


Trajetória
Nascido em Minas, mas carioca de coração e convicção, Alceu Penna desenhou desde cedo. Começou a estudar arquitetura, porém acabou escapando para as Belas Artes. Artista moderno, Penna não impunha limites a sua capacidade de criação. Ainda jovem, trabalhou na imprensa, fazendo ilustrações, cartuns e histórias em quadrinhos. Mais tarde, colaborou com a Esquire, ainda hoje uma das conceituadas publicações da imprensa norte-americana.


Como designer (antes da palavra ser usada), concebeu menus, cartazes; apaixonado pelas artes, criou cenários e figurinos para espetáculos cênicos. Com seu traço, marcadamente influenciado pelo trabalho de artistas norte-americanos, criou ainda fantasias de carnaval e figurinos para Carmem Miranda e seu grupo de apoio, o Bando da Lua.


A amiga, ícone maior da brasilidade para os estrangeiros, o ajudou nos EUA. Mas foi ele quem lhe retribuiu com um presente maior: a característica dança de Carmem Miranda, em que fazia ondas com a saia, foi "sugestão" do amigo.


A contribuição dá uma mostra do talento de Alceu Penna para o comportamento atrelado à moda feminina. Amante da alta-costura, tornou-se ele mesmo um estilista de sucesso no Brasil (a escassez de produtos "supérfluos" durante a Segunda Guerra Mundial contribuiu para isso). Unindo as duas paixões, a moda e a ilustração, marcou as páginas da revista O Cruzeiro, dos Diários Associados, com a sessão "As Garotas do Alceu". Nela, dava dicas de moda e comportamento e instigava as mulheres a serem mais ousadas e mais independentes.


HQ
Um dos ganhos da nova edição, revista e ampliada, é o detalhamento do trabalho de Alceu Penna com as histórias em quadrinhos, no começo de carreira. Para Gonçalo Junior, Penna foi um pioneiro de uma nova forma de pensar esta linguagem. "Ele é um dos pais da moderna HQ no Brasil. Antes dele, você tinha os quadrinhos infantis de ´O Tico Tico´ (revista para crianças fundada em 1905, que trazia material em quadrinhos). No Suplemento Juvenil, que trazia histórias de aventura dos EUA, ele se juntou ao maior dramaturgo brasileiro do século XX, Nelson Rodrigues, para fazer adaptações literárias que também atendiam ao leitor adulto. Ele fez cerca de 300 páginas, entre adaptações de ´Alice no País das Maravilhas´, ´O Mágico de Oz´ e outros", detalha Gonçalo Junior. O pico da produção quadrinhística de Alceu Penna aconteceu entre 1937 e 1942. Contudo, ele nunca se distanciaria da área. Foi ele quem lançou o jovem e promissor Millô Fernandes, e é uma das referências confessas do pai do Menino Maluquinho, Ziraldo.


Novos projetos
Gonçalo Junior é um nome para guardar na memória. Na última década, o jornalista se notabilizou ao publicar alguns dos mais densos trabalhos sobre as histórias em quadrinhos no Brasil. Longe do ufanismo de autores de outros tempos, Gonçalo se especializou no que chama "reportagem da história". Em seus livros, ele detalha histórias (nem sempre admiráveis) por traz do mercado e da arte das HQs no País. Em sua bibliografia, se destacam "A Guerra dos Gibis" (2006), sua continuação, "Maria Erótica e O Clamor do Sexo" (2010). Prepara dois novos livros, um sobre a revista O Grilo, marco da HQ undergroundo no Brasil; e outro sobre a história do chiclete.

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