Por Quadrinheiros - via RQ facebook
É difícil mencionar um super-herói ou equipe de peso que não tenha passado pela cabeça de Grant Morrison (e por tabela pelas mãos de Frank Quitely). O escritor escocês já trabalhou com o Batman, Superman, X-Men, Quarteto Fantástico, Liga da Justiça etc. Mas antes de ficar conhecido pelo grande público Morrison trabalhou (e eventualmente volta a trabalhar) com projetos mais autorais.
Doom Patrol, ou Patrulha do Destino foi um desses trabalhos. Foi com as ideias do careca e no selo Vertigo que o título ganhou ares de cult e foi lá que Flex Mentallo, O Homem do Músculo Mistério, teve sua primeira aparição para depois ressurgir em sua própria minissérie.
Flex Mentallo marca a primeira parceria de Grant Morrison e Frank Quitely, lançado originalmente em 1996, a minissérie de 4 edições teve seu relançamento em versão de luxo no ano passado nos EUA e é essa que a Panini lança agora no Brasil.
Flex Mentallo é um super-herói na mais pura acepção do termo. Nobre, corajoso e altruísta, um herói que simplesmente não se encaixava nos anos 90, onde vigorava a Era de Ferro dos quadrinhos, também chamada por vezes de Era Moderna (Morrison prefere o termo Idade das Trevas), com seus super-heróis extremamente realistas, para leitores maduros, impulsionados por sucessos como Watchmen e O Cavaleiro das Trevas.
Em grande parte Flex Mentallo pode ser lida como uma grande crítica a esse período pelo qual passavam os quadrinhos de super-heróis na década de 90. Podemos ler ao longo de suas páginas nas reflexões de Flex Mentallo ONDE FORAM PARAR OS BONS E VELHOS TEMPOS? OS HERÓIS E VILÕES, AS PARCERIAS, AS INVENÇÕES? HOJE EM DIA PARECE QUE A CHUVA NÃO PARA. É COMO SE NÃO HOUVESSE MAIS LUZ e, em outro momento QUEM É QUE SEMPRE SALVA O MUNDO? OS SUPER-HERÓIS, ORAS… FOI COMO UMA LÂMPADA QUE SE ACENDEU EM MINHA MENTE, DISSIPANDO AS SOBRAS DA LONGA NOITE ESCURA EM QUE NOS ENCONTRÁVAMOS. LEMBREI-ME DE COMO ERAM AS COISAS. LEMBREI-ME DE COMO CURVAMOS O MUNDO SOBRE O PRÓPRIO EIXO PARA SALVAR A VIDA DE UMA CRIANÇA. LEMBREI-ME DE QUANDO VOAMOS AOS LIMITES DE GALAXIAS TITÂNICAS E DESCONHECIDAS PARA SUPLICAR PELA SOBREVIVÊNCIA DA HUMANIDADE. LEMBREI-ME DE QUANDO SALVÁVAMOS GATINHOS EM ÁRVORES SEM EXIGIR RECOMPENSA. Lembrar é tudo o que resta a Flex Mentallo, um herói deslocado.
Mas isso é apenas um nível no qual se pode ler a história. Existem mais. Na verdade o mote central da história é responder à pergunta “de onde vem as ideias?”, sendo que a trama se desenrola em três níveis: 1) Flex Mentallo tentando descobrir o que aconteceu com seu amigo Fato e o que é a Faculdade X; 2) Um astro de rock à beira da morte que narra sua experiência com gibis para um desconhecido ao telefone e 3) um mundo de super-heróis que tenta escapar do Absoluto, uma entidade que ameaça todo seu universo. E isso tudo faz sentido e se conecta nas páginas de Flex Mentallo, acredite.
Flex Mentallo pode ser vista como uma grande alegoria para nossa relação com as histórias em quadrinhos: o rock star que narra sua relação com gibis pode ser qualquer um de nós, e qualquer fã de super-heróis pode se identificar com sua história: gibis como um modelo de personalidade, como uma fuga da realidade… Mas Grant Morrison extrapola os limites da metalinguagem quando nos revela que o herói tem uma fraqueza, o Mentallium, apresentado em diferentes cores, a mais bizarra o Mentallium Ultravioleta que pode transformar Flex Mentallo em qualquer pessoa com vida e memórias próprias e, sob sua influência, Flex sempre esquece que já foi um super-herói, o que significa que… VOCÊ PODE SER FLEX MENTALLO!
E também podemos encarar Flex Mentallo como uma releitura de cada Era dos quadrinhos de super-heróis, são 4 edições, para a Era de Ouro, de Prata, Moderna e a última edição que prenuncia a chamada Era Pós-Moderna, ou o que Grant Morrison chama de Renascença deixa clara a concepção do autor sobre super-heróis: SÓ UM GAROTO PUBESCENTE E CHEIO DE AMARGURA PARA CONFUNDIR REALISMO COM PESSIMISMO.
Nos anos 90 a moda era ser realista e realismo era imaginar como super-heróis se comportariam em nosso mundo. Ao fazê-lo, tornaram-se outra coisa, podiam continuar sendo supers, mas estavam longe de serem “heróis”, quase como uma dessacralização do mito.
Flex Mentallo é a prova de que é possível fazer uma história de super-herói para um público maduro sem necessariamente ser pessimista ou mesmo realista, reconstruindo o heroísmo arquetípico dos super-heróis. Como disse o escocês careca uma vez: quadrinhos para o lado direito do cérebro.
Nota: mais surreal que a história de Flex Mentallo é somente tentar entender porque os tradutores (Erico Assis/FD) traduziram Man of Muscle Mystery por O Homem dos Músculos Mistério. Por que esse plural grotesco? Mais um mistério exclusivo para leitores tupiniquins.
Um comentário:
Poxa,sempre curti a patrulha do destino e esse tempo todo não sabia que era cria do Grant. Queria que postassem aqui a origem dessa equipe.
Obrigado.
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