Por Giorgio Cappelli - GHQ
Agora, imaginemos que esse nosso jornalista apreciador de quadrinhos conheça o detetive Dick Tracy. Esse personagem, criado nos anos 1940, investigava crimes usando técnicas periciais. Sua marca registrada, além do queixo quadrado e dos bandidos tão bizarros quanto os do Batman, é um rádio-relógio de pulso, com o qual se comunica com os colegas de polícia. Outra vez o “acadêmico” chamaria a isso de impossibilidade científica para a tecnologia da época. Sim. Analisando com menos superficialidade, Chester Gould, criador de Dick Tracy, simplesmente adiantou-se a seu tempo. Ele sonhava com os pés no chão.
Quando encontro títulos de matérias do tipo “A ciência nos quadrinhos” em revistas ou jornais, sinto o coração gelar. Já sei que vem vindo por aí um festival de bobagens. Mesmo assim, respiro fundo, venço meu preconceito, me encho de coragem e enfrento o texto. Quase sempre fico inconformado com o que leio.
Por obra e graça de algum raciocínio que eu nunca vou entender, certos jornalistas perdem o tempo deles (e o nosso) entrevistando acadêmicos sobre impossibilidades físicas, como o voo do Super-Homem, a flexibilidade na armadura do Homem de Ferro, o fator de cura do Wolverine, o dom da fala do Pato Donald, entre muitas outras. Os entrevistados chegam mesmo a afirmar que a radiação jamais permitiria a existência de um Hulk ou de um Homem-Aranha. Não brinca! E eu que podia jurar que qualquer animal irradiado me
transmitiria seus poderes através de uma mordida. Lá se foi mais um sonho de criança…!
transmitiria seus poderes através de uma mordida. Lá se foi mais um sonho de criança…!Uma pena que tais PHDs em Física e analfabetos em imaginação nunca sejam confrontados com um jornalista que conheça mesmo Histórias em Quadrinhos. Ele os surpreenderia com uma aventura do Homem-Aranha, cujo tema é clonagem. Nela, explicaria o hipotético jornalista, Peter Parker e sua falecida namorada são “xerocados” por um cientista inconformado com a morte da garota. Isso em 1975, e olha que a maioria das pessoas só veio a saber o que era um clone graças à ovelha Dolly, que veio ao mundo em cinco de julho de 1996 – vinte e um anos depois da publicação.
“Ah, mas não existia tecnologia para isso nos anos setenta”, argumentaria o acadêmico. E o jornalista rebateria: “A questão não é essa. Você disse que os quadrinhos só falam de coisas erradas e impossíveis. Esse quadrinho fala de algo que a própria ciência já mostrou ser possível. Se o conceito de reproduzir um ser vivo a partir de uma única célula já existia em 1975, não se pode falar em delírios de roteirista.”
Agora, imaginemos que esse nosso jornalista apreciador de quadrinhos conheça o detetive Dick Tracy. Esse personagem, criado nos anos 1940, investigava crimes usando técnicas periciais. Sua marca registrada, além do queixo quadrado e dos bandidos tão bizarros quanto os do Batman, é um rádio-relógio de pulso, com o qual se comunica com os colegas de polícia. Outra vez o “acadêmico” chamaria a isso de impossibilidade científica para a tecnologia da época. Sim. Analisando com menos superficialidade, Chester Gould, criador de Dick Tracy, simplesmente adiantou-se a seu tempo. Ele sonhava com os pés no chão.Nosso jornalista, ainda desejando torturar o teórico, evocaria o nome de Buck Rogers.
Aprisionado por acidente em uma mina abandonada, ele é mantido em animação suspensa graças a um gás desconhecido, só acordando em 2430. Embora as primeiras aventuras tenham sido criadas em 1929, o autor acertou ao prever a igualdade de direitos e papéis entre homens e mulheres, passeios em naves espaciais e apetrechos acopláveis às costas que permitem o voo individual quase do mesmo modelo visto em Rocketeer.
Aprisionado por acidente em uma mina abandonada, ele é mantido em animação suspensa graças a um gás desconhecido, só acordando em 2430. Embora as primeiras aventuras tenham sido criadas em 1929, o autor acertou ao prever a igualdade de direitos e papéis entre homens e mulheres, passeios em naves espaciais e apetrechos acopláveis às costas que permitem o voo individual quase do mesmo modelo visto em Rocketeer.Ficção científica, senhor acadêmico? Tal aparelho geraria calor demais e queimaria seu usuário, certo?
Permita-me então apresentar-lhe duas empresas: a TAM (Tecnologia Aeroespacial Mexicana) e a Jetpack International; e um inventor, Glenn Martin, para mostrar que os quadrinhos acertaram outra vez. Os aparelhos das citadas empresas fazem perto de 100 quilômetros por hora e conseguem se manter no ar de 30 a 33 segundos. O outro alcança a altura de 1,5
quilômetros e estará à venda (sim, você leu certo) em 2012.
quilômetros e estará à venda (sim, você leu certo) em 2012.Como fica agora o argumento da falta de tecnologia na época? Ainda falta muito tempo para 2430. Caso o acadêmico cético reclamasse do desempenho dos veículos, lembremos que o 14-Bis de Santos Dumont saltava e subia pouco mais de 90 centímetros do chão. Os aviões de hoje em dia fazem muito mais que isso. Quanto à comparação de tamanhos, os rádios encolheram bastante desde seu nascimento. Chegar aos modelos diminutos de Buck Rogers é uma questão de paciência e da evolução natural da tecnologia. Ponto pros quadrinhos, de novo!
O acadêmico ainda teima, e afirma que, mesmo assim, há limites para a tecnologia que os
quadrinhos não respeitam. Pois nosso jornalista quer ver sangue! Ele agora vai até o Japão, onde o quadrinista Osamu Tezuka, à semelhança das obras de Isaac Asimov, criou, em 1952, o personagem Astroboy, imaginando uma sociedade em que humanos e robôs conviveriam normalmente. Com o atual desenvolvimento dos robôs assemelhados a humanos – os chamados andróides – no próprio Japão, será que essa previsão não se encontra mais perto do que imaginamos?
quadrinhos não respeitam. Pois nosso jornalista quer ver sangue! Ele agora vai até o Japão, onde o quadrinista Osamu Tezuka, à semelhança das obras de Isaac Asimov, criou, em 1952, o personagem Astroboy, imaginando uma sociedade em que humanos e robôs conviveriam normalmente. Com o atual desenvolvimento dos robôs assemelhados a humanos – os chamados andróides – no próprio Japão, será que essa previsão não se encontra mais perto do que imaginamos?O acadêmico começa a suar frio, e nosso jornalista continua batendo mais que campeão de MMA. Na Bélgica, Tintim, personagem de HQ do qual já falamos por aqui, chegou à Lua em 1954, quinze anos antes do americano Neil Armstrong. Antes de Tintim, Júlio Verne fez três tripulantes darem uma volta pela órbita da Lua em 1865 – mais de cem anos de antecedência. Havia tecnologia para mandar um homem até lá no século XIX? Não, mas os cientistas adoram mencionar Júlio Verne e o fato de esse escritor ter “previsto” o surgimento do helicóptero, doaqualung, da televisão. O que eles esquecem de dizer, ou não querem, é que Verne usava uma grande ferramenta para aguçar a imaginação: a pesquisa. A mesma usada pelos roteiristas de quadrinhos mencionados nesta matéria.
Portanto, meus caros teóricos e acadêmicos, vamos parar com essa implicância com a ficção científica nos quadrinhos. Aprendam a separar a fantasia divertida da ficção embasada. Sonhem com o dia em que poderemos usar a antigravidade, conversar por telefones holográficos, atravessar o sistema solar em questão de segundos, ter amigos alienígenas, dinossauros de estimação e políticos honestos.
Acreditem no impossível.
Giorgio Cappelli é tradutor e revisor com pretensões a quadrinista. Também sabe que o som não se propaga no vácuo e nem por isso fica reclamando quando escuta as naves manobrando, disparando ou explodindo em Guerra nas Estrelas.

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