Mike Madrid analisa o papel histórico das mulheres nas HQs
e vê mudanças sociais e comportamentais
e vê mudanças sociais e comportamentais
Botas insinuantes, malhas justas, tops estupendos, braceletes vigorosos, bustiês apertados, coxas torneadas, cintos em cinturas muito finas com grandes fivelas dividindo corpos ao meio, seios fartos, discursos de emancipação feminina. Leitores ordinários de quadrinhos não terão prestado muita atenção nisso, mas os mais atentos sabem: as superpoderosas dos comics sempre deram um banho de estilo e sensualidade.
Agora, um livro publicado nos Estados Unidos, , de Mike Madrid, debruça-se sobre esse universo pouco explorado das histórias em quadrinhos. Mike Madrid é editor de cultura pop da Exterminating Angel Press, pequena editora de São Francisco, e produziu talvez o mais interessante ensaio até agora sobre o tema. E é um sucesso: em outubro, o livro era o número 1 em compras na Amazon, na categoria comics, e o número 2 no tema “feminismo”.
Mulher Maravilha, Supermoça, Batgirl, Mulher Gato, Mulher Invisível: partindo do início das HQs, o grande mérito de Madrid é mostrar como as heroínas dos quadrinhos se vestem e se deslocam pelo mundo conforme a moral e os costumes de suas épocas. E continuam mudando: a nova Spider-Woman (Mulher-Aranha) é uma agente secreta caçadora de alienígenas, membro dos Novos Vingadores, e a Batmoça é uma lésbica de ascendência judaica.
O mundo do herói macho, nos quadrinhos, é de fato mais conservador, no estudo de Madrid. Década após década, as roupas e os personagens femininos modificam-se conforme as mudanças sociais e morais, mas os personagens masculinos permanecem praticamente os mesmos.
No início, por conta do Comics Code Authority (CCA) do Senado americano, as supergarotas dos quadrinhos tinham de seguir uma imagem palatável de mãe e esposa. São daí a laboriosa Mulher Invisível (membro do Quarteto Fantástico) e a Marvel Girl. “Eu não respondo a ninguém”, dizia a vilã Madame Medusa, que o Quarteto Fantástico enfrentou em 1965. Era assim que a mulher liberada era vista, como uma malfeitora.
Mas a consciência social começava a mudar. Em 1966, a vilã encarnada pela atriz Julie Newmar no seriado Batman, a Mulher Gato, impulsionou a felina maldosa para um patamar inédito de popularidade. Nos anos 70, com a explosão dos movimentos pelos Direitos Civis, tudo virou de pernas para o ar – e de microssaia. Em 1969, chegava com tudo uma anti-heroína de biquíni vermelho que faria o sangue dos rapazes ferver: tratava-se de Vampirella, uma revisão dos gibis de terror criada pelo editor James Warren.
Foi nessa época, em 1975, que Tempestade entrou para os X-Men, e a revolução sexual começou a dar as caras por baixo das máscaras e das malhas. As novas integrantes dos X-Men mostravam apetite para algo mais do que papéis coadjuvantes. A jovem Kitty Pryde, de apenas 14 anos, durante uma missão, em 1986, revela que está de olho nos bíceps do gigante Colossus, de 19 anos.
“Nos anos 90, tivemos uma explosão de personagens femininos e todos tinham suas próprias revistas. Mas eram incrivelmente sexualizados. Personagens como Lady Death tinham seios descomunais e eram mostrados tomando banhos em piscinas de sangue”, analisa o autor. Apesar dessa explosão de heroínas com “implantes de seios” dos anos 90, Madrid também vê avanços no mundo do comic book feminino. O maior deles, em sua opinião, foi o lançamento de um gibi intitulado Birds of Prey, uma espécie de “Thelma e Louise do mundo dos quadrinhos”.
Birds of Prey é a união de duas heroínas, Oracle (que antigamente era conhecida como Batgirl, e hoje vive em cadeira de rodas) e Black Canary. Oracle é uma espécie de irmã mais velha e treinadora de Black Canary. Em 2003, elas adicionam ao time outras duas lutadoras, Huntress e Lady Blackhawk (uma esquecida heroína dos anos 1950). Elas põem o combate ao crime em segundo plano, e discussões de questões como amor, solidariedade e sexo em primeiro.
Outra heroína típica dos novos tempos é Jenny Sparks, líder de The Authority. Jenny bebe e fuma, é bissexual e “conserta” o mundo na porrada. Mulheres violentas e mulheres vítimas de violência. Em 2006, quando a primeira Robin mulher, Stephanie Brown, foi brutalmente assassinada nos quadrinhos, comunidades de fãs feministas começaram a discutir o tratamento dado aos personagens femininos. Eles acusavam os editores de preconceito, já que outros Robins que passaram pela Batcaverna tinham memoriais na saga de Batman, e Stephanie foi imediatamente esquecida. A pressão surtiu efeito. Este ano, a DC Comics lançou uma nova série em que Stephanie ressuscita e se torna a nova Batmoça.
“As pessoas me perguntam por que as mulheres não leem quadrinhos. Eu acho que elas leriam, mas os gibis de super-heróis são todos sobre brigas e as mulheres estão procurando por algo mais que isso”, diz Mike Madrid. De olho nesse universo e no crescimento do leitorado feminino, as editoras começaram a pensar com mais atenção no que pode ser atrativo para o mundo das supergarotas.
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