A norte-americana Alison Bechdel é homossexual assumida desde seus 20 anos. Autora da série de tiras Dykes to Watch Out For (em tradução livre, "Sapatas para Ficar de Olho"), que começou a ser editada em publicações gays no início da década de 1980.
Nos primeiros anos, Dykes to Watch Out For não era uma história serializada e com personagens fixos. Só quatro anos depois, em 1987, que foram apresentadas Mo e suas amigas.
Mas “a” obra de Bechdel é Fun Home – uma tragicomédia em família (lançado aqui pela Conrad). A obra demorou sete anos para ser concluída e foi lançada nos EUA em 2006, recebendo o Eisner Awards (melhor obra baseada em fatos) e sendo reconhecido como melhor livro do ano pela revista Time.
Autobiográfico, em Fun Home Alison conta sua infância, sua descoberta do homossexualismo e, essencialmente, suas impressões acerca do pai. Principalmente quando descobre (depois de sua misteriosa morte) que ele também era homossexual, mas ao contrário dela, enrustido.
Apesar de não seguir ordem cronológica, o livro não situa em nenhum momento o “presente”, mas salta de um lado para o outro para analisar seu convívio familiar, sobretudo o paterno, com inteligentes alusões literárias que vão de mitos gregos de Ícaro e Dédalo, passando por Marcel Proust, Oscar Wilde e James Joyce.
Bechdel é honesta, reflexiva e detetivesca nos seus relatos. Na infância, não sabia “quem era” mesmo com uma personalidade forte. Seu pai era perfeccionista, com uma obsessão por restaurar sua antiga casa neogótica e manter as aparências familiares, ficando sempre bem na fotografia social como seus pomposos cômodos e vasta biblioteca.
Ao lado dos dois irmãos, Alison cresceu na funerária de seu pai, onde os cachepôs e os objetos de cerimonial fúnebre são usados como brinquedos. O “Fun” do título refere-se abreviadamente à “Funeral” e também à “Casa de Diversões”, aquelas dos parques em que têm salas de espelhos etc. Na versão nacional foi traduzido como “lar da graça”. Apesar de perceber que o tradutor quis passar a ambivalência de engraçado (para as crianças) e do espiritual (para os mortos).
A autora não se preocupa em revelar tudo de modo mais impactante. Simplesmente relata os acontecimentos naturalmente, como em uma conversa consigo mesma que já sabe de todas as coisas, mas desconhece encaixá-las.
Para Alison, tanto se descobrir na adolescência quanto revisitar os fantasmas do passado na produção do livro foram difíceis, mas de maneiras diferentes. A pior parte para ela foi o momento em que se “tocou” quem realmente era e a morte (e “revelação” da sexualidade) do pai. Três meses depois que ela revelou ser lésbica a família, ele já estava morto.
As tiras de Dykes to Watch Out For foram suspensas desde 2008 e até agora Bechdel está se dedicando ao outro lado da sua moeda de memórias, Love Life: A Case Study, que desnuda seus relacionamentos amorosos.
Fonte: Audaci JR. para o Quadrinho.com - 24.10.10
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