segunda-feira, 18 de julho de 2011

O quadrinho erótico em alta

Por: Pedro de Luna

capa caderno B 28-08-2010

Na origem da palavra, catecismo é uma instrução religiosa, o ensino oral da religião cristã. Porém, nos anos 50 e 60 os catecismos eram pequenas revistas que apresentavam o mundo erótico e do sexo para uma população de jovens que não tinham nenhuma informação a respeito. Durante a ditadura, sexo era considerado subversão, coisa de comunista. No entanto, editoras brasileiras lançaram revistas masculinas e peitaram os militares. O erotismo continua em alta nos dias de hoje, através de livros belamente desenhados por artistas como o italiano Milo Manara, e lançados continuamente e sem censura. Preferências a parte, o que não faltam são bons títulos.
Materia caderno B 28-08-2010




CATECISMO EM QUADRINHOS
O jornalista Worney Almeida de Souza é o autor da caixa Quadrinhos Sacanas (Editora Peixe Grande), editado por Toninho Mendes, que em seu primeiro volume traz quatro livrinhos de bolso de temas variados: animais, homossexuais, sexo espacial e defloramento. São histórias em quadrinhos originais dos anos 50 e 60 responsáveis pela iniciação sexual de muita gente. Ele explica que o critério de escolha foi temas inusitados e que pudessem apresentar autores com estilos diferentes e pouco conhecidos:


---- Serviram para que muita gente descobrisse o sexo, sem as limitações ou imposições da moral burguesa e da visão da Igreja Católica. Hoje a situação é muito diferente: o sexo é um produto de consumo que é enviado pela goela de todos, especialmente os jovens. O sexo é um assunto muito comum e banalizado, os sites pornôs são um veiculo de consumo muito eficiente, mas não cumprem o papel dos antigos catecismos.


Animado, ele já está dando os últimos retoques no segundo volume, intitulado Quadrinhos Sujos, que será dedicado às HQs americanas satirizando atores e atrizes do cinema e dos quadrinhos. Mas será que os leitores ficarão a vontade de ler qualquer um dos livrinhos em público?


--- Creio que mesmo com toda a liberalidade que permeia as publicações eróticas ou pornô, ainda existe uma predisposição sobre a leitura pública de HQ eróticas. Mas, francamente, existem lugares e lugares para se abrir uma revista pornô!


Caixa Quadrinhos Sacanas




QUADRINHOS E PORNOGRAFIA NA DITADURA MILITAR
O também jornalista Gonçalo Junior, autor de Guerra dos Gibis, acaba de lançar o segundo volume da série, também batizado de Maria Erótica e o clamor do sexo (Editora Peixe Grande). Novamente o foco é a história em quadrinhos como alvo de censura, porém, desta vez o livro fala sobre duas editoras de gibis que exploraram erotismo e foram vítimas do regime militar.


---- Não era possível desvincular a história da Edrel e da Grafipar do seu contexto político, uma vez que erotismo era apontado como arma dos comunistas para destruir a família brasileira. Foi preciso situar as duas editoras dentro da repressão da ditadura.


Entre os vários desafios do novo livro, Gonçalo destaca a entrevista com Paulo Fukue, desenhista da Edrel que foi preso e torturado, acusado de subversão.


---- Foram 15 anos entre o primeiro contato e a entrevista, realizada em 2006. Acho que amadureci em minha escrita, o que me permitiu um maior domínio na hora de fazer o texto final. O livro ficou com 750 mil caracteres, dez vezes menos que o esboço original. Tive de enxugar e cortar muita coisa. Mas o essencial está aí.


A ligação entre a HQ erótica e as revistas masculinas é enorme, como explica o autor:


-- Sexo era considerado subversão, arma de comunistas para acabar com o capitalismo. Ao mesmo tempo, as duas editoras estudadas publicaram muitas revistas masculinas, com fotos de mulheres seminuas. A mesma repressão que atingiu estas afetou os quadrinhos.
livro Maria Erotica


O que chama a atenção é que tanto Gonçalo Junior quanto Worney de Souza não temem que seus livros sejam censurados ou boicotados nas lojas. Pelo contrário. Worney diz que as grandes redes são os principais compradores da sua caixa de HQs de catecismo. Gonçalo concorda e acrescenta:


---- Está muito claro o seu propósito na capa, na contracapa e nas orelhas: é uma forma nova e inusitada de contar a história da ditadura militar pela censura às revistas de sexo. Tanto que brinco no verso, onde escrevi CENSURA LIVRE.


Mas nos dias de hoje as revistas masculinas ainda têm sua função catequizante em plena era digital?


--- Creio que não. Os mecanismos do sexo são muito escancarados e essa função educativa está diluída em muitos veículos diferentes. --- devolve Worney.


Na opinião de Gonçalo, o meio digital não tirou o espaço para a pornografia impressa.


--- Costumamos ver a internet de forma meio deturpada, pois é pequeno o percentual de brasileiros que acessam privativamente a rede e os sites de sexo. Quantos são eles? 5% ou 10% da população? A maioria que tem contato com computador o faz no trabalho e nas lan houses, sem qualquer privacidade. E a HQ erótica continua a ser feita porque ainda tem mercado.


QUADRINHOS ITALIANOS NO BRASIL
Milo Manara (1945-) é um dos principais nomes do quadrinho erótico mundial. Sua fama mundial veio com a série Clic, sobre uma recatada dama da alta sociedade que descobre o prazer num clique de uma máquina. A Conrad Editora já lançou três álbuns no Brasil e promete o quarto volume em breve.


A mesma editora também lançou os três primeiros volumes (de uma série de 4) de Bórgia, uma parceira de Milo Manara e o chileno Alejandro Jodorowsky, sobre a saga da família Bórgia, que ficou famosa no século XV por dar ao mundo dois papas de reputação duvidosa e se tornaram símbolo de decadência da Igreja no fim da Idade Média. Com um roteiro fluido e arte belíssima, o leitor ficará impressionado tanto com o sexo, que inclui cenas de incesto e estupro, quanto à violência explícita.


detalhe de Borgia numero 3 de Manara


capa do livro de Giovanna CasottoHá ainda que destacar o álbum Giovanna, criado por Giovanna Casotto, a primeira quadrinista italiana a desenhar histórias eróticas. Inspiradas nas pin-ups dos anos 1950, a artista é famosa pelo realismo de suas ilustrações. Para aguçar ainda mais a imaginação do leitor, ela tira fotos de si própria nas mais variadas posições para depois utilizar como base de seus desenhos. E se uma mulher assim já seria capaz de levar a imaginação de qualquer pessoa longe, que tal dez diferentes? Neste livro, a autora escolhe suas personagens a dedo, entre empregadas, esposas e enfermeiras. Vale todos os centavos dos R$ 50 cobrados pela obra.


PUBLICADO EM 18.11.10

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