terça-feira, 22 de julho de 2014

Será que o mundo está pronto para um Capitão América negro?

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Capitão América: O Spiritual* da américa do Século XXI
Por   - IHQ 
Ao longo de sua carreira o Capitão América foi visto como o sonho do americano médio dos anos 1940, espelhando a visão que o artista Norman Rockwell vendia nas capas de alguns semanários. O sonho americano envolvia a família nuclear feliz e o respeito que todos tinham pelo self made man de meia idade.

Repare na origem do personagem: Um americano médio emasculado que se torna um Charles Atlas de farda devido a uma mistura de droga e treinamento vai para a Alemanha socar o inimigo do mundo. Simples e infantil, certo?
Na verdade, numa leitura mais profunda entendemos que na verdade o personagem nada mais é do que o sonho ariano de Hitler se voltando contra ele.
O capitão e sua América se completavam, só que o mundo mudou e o personagem não sobreviveu à década seguinte. Nos anos 1960, entretanto, o personagem foi ressuscitado. No auge de Jack Kerouak e Chester Willians os criadores aproveitaram o fato de seu conceito ter expirado o prazo de validade e o mandaram em busca da sua América, algo comum naquela época de questionamentos e transições.
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No percurso, ele encontrou novos e velhos personagens que refletiam os problemas e soluções surgidos nas duas décadas em que esteve ausente. Uma grande mudança foram os movimentos raciais. Os negros, que até então eram segregados aos seus lugares de direito, lutavam por um país que refletisse seus direitos. Era a época do Partido dos Panteras Negras, Malcolm X e Martin Luther King, quando a pedido de King Michelle Nichols se manteve em Star Trek a tempo de protagonizar o primeiro beijo inter-racial da TV.
Nada mais justo que Steve Rogers ganhasse um Bucky negro, o que só não aconteceu porque a palavra “Bucky” é considerada uma ofensa étnica em parte dos EUA. Surgia o Falcão. De negro necessário à voz das minorias americanas o personagem cresceu tanto que durante a explosão da Blaxploitation dos anos 70 se tornou um dos protagonistas do título.
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Na época chegaram a alegar que o personagem era um bandido de rua que sofreu uma lavagem cerebral para receber ideais heroicos simpáticos aos do Capitão que acabaria (como de fato aconteceu) fazendo dele o seu novo Friday boy**. Felizmente ou infelizmente essa ideia de passado manchado foi abandonada e o personagem ganhou suas asas.
Quando o Capitão decidiu abandonar seu status pela primeira vez o Falcão chegou a ser parceiro de alguns de seus sucessores, mas com o tempo acabou voltando ao papel de coadjuvante e foi desaparecendo aos poucos até finalmente cair no limbo dos personagens sem função.
Na virada do milênio não só trouxeram o personagem de volta como fizeram vários esforços para mantê-lo relevante.
De certa forma seu retorno foi uma “exigência” do mercado.
Com a entrada de Barack Obama e de seu “Yes, we can”; a forma como os negros tem sido vistos pela mídia mudou bastante. O sonho de Martin Luther King havia se concretizado. Na verdade, ainda faltava um elemento. Um símbolo da raça ariana perdido no tempo precisava cair. E foi o que aconteceu.
A partir de novembro teremos um novo Capitão América. Cronologicamente não será o primeiro negro a vestir a farda, mas será o primeiro a assumir o título do personagem que apesar de todas as mudanças sempre contou a história de protagonistas caucasianos.
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E o curioso é que dessa vez não será criado um novo personagem nem recontarão a anos de história para isso. O novo Capitão América sempre esteve por perto e esperou cinco décadas para portar o escudo. Seu nome é Sam Wilson e ele já foi o Falcão.
Quando Rogers envelhece mais de 60 anos após ter perdido o soro do supersoldado é hora de seu Friday Boy evoluir e erguer o escudo que representa o sonho americano e escrever um novo capítulo na história do título.
Provavelmente é uma mudança temporária, ainda assim é uma mudança interessante, afinal o novo Capitão não só erguerá o escudo como poderá voar, o que remete a outro símbolo americano.
Não dá para dizer que é uma ousadia, mas podemos dizer que até que demorou bastante até algo assim finalmente acontecer. O que hoje vemos como marketing teria sido uma ousadia interessante nos anos 1960.
*Spirituais são canções que evoluíram para se tornar o Gospel que conhecemos, mas originalmente eram dicas em forma de canção que eram dadas aos escravos que fugiam em busca de sua liberdade.
**O termo Friday Boy (ou Woman) é inspirado no Sexta-feira de Robinson Crusoé e normalmente é uma forma pejorativa de dizer “Faz tudo”.

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