Os Embalos do Homem-Aranha
Por Fernando Piccolo
E estamos em 1978, finalzinho da década de 70. A Casa das Idéias aparecia nas bancas sob o selo da Bloch Editores, forte por conta da revista Manchete (ainda existe?). Além dos títulos triviais, como Homem-Aranha, Hulk, Capitão América, Vingadores, etc., também estavam à disposição do pessoal boa parte da linha de terror da Marvel Comics.
O quê? Você não sabia que a Marvel teve uma linha de terror? Pois é, houve um tempo em que a Marvel investia em outras coisas além dos ?diferentes perseguidos por uma sociedade que os odeia?. Havia a linha trivial de super-heróis, a linha ?fantasia? com Conan, Sonja, Kull, e outros criados por Robert Howard, a linha de humor, cujo grande representante foi Howard, o Pato, e a linha de terror, com Dracula (já citado no capítulo passado), Lobisomem (no original, Werewolf by Night), Frankenstein, a Múmia (The Living Mummy), entre outras criaturas da noite.
E isso veio pra cá! A Bloch, bastante oportunista, lançou o selo ?Capitão Mistério?, pelo qual os leitores brasileiros acabaram conhecendo personagens como Irmão Vodu, Satana, Lilith, Morbius, além dos já citados no parágrafo anterior. Mas não durou muito.
Algumas das revistas da linha de terror da Bloch |
Em janeiro de 1979, a Bloch encerrava o título do Homem-Aranha em sua edição de número 33. Todavia, já no mês seguinte, a Rio Gráfica Editora ? propriedade da família Marinho (os donos da Rede Globo, rapaz alienado!) - assumia a incumbência de publicar as crias de Stan Lee por aqui. Hulk e Homem-Aranha, pra variar, foram os primeiros a ganhar sua revistinha própria. Logo em seguida veio a revista ?Os Quatro Fantásticos? e as séries bimestrais Almanaque Marvel e Super-Heróis Marvel, em abril e junho, respectivamente. A primeira trazia as aventuras de Nova (que faziam bastante sucesso entre os leitores brasileiros, mais ainda do que entre os americanos), Mulher-Aranha e X-Men. A segunda trazia histórias das revistas Marvel Team-Up (o Homem-Aranha e um convidado especial) e Marvel-Two-in-One (o Coisa e um convidado especial). Naqueles tempos, almanaques eram a última moda, e tanto o Aranha como o Hulk tinham os seus. A editora se aventurou também com um álbum de figurinhas de seus personagens.
X-Men, Homem-Aranha, Hulk... A elite dos heróis Marvel estava na RGE. |
Se você prestou atenção, deve ter sentido falta de um monte de personagem na RGE, né? Pois então, caras como Thor, Capitão América, Homem de Ferro, Punho de Ferro (e não de ?aço? como queria a Bloch), Surfista Prateado, Mestre do Kung-Fu só apareceriam novamente nas bancas meses depois, e pela paulistana Editora Abril, que expandia a sua linha de quadrinhos infanto-juvenis, já composta por Disney, Maurício de Souza e Hanna-Barbera.
Figurinhas dos chicletes Ping-Pong |
Capitão América #1 e Terror de Drácula #1, em junho de 1979, inauguraram a nova linha, seguida por Heróis da TV, em julho. Super-Heróis eram a moda entre as crianças da época. A Gulliver trouxe uma coleção de bonecos e imagens dos seus personagens preferidos podiam ser encontradas até no seu chicle-de-bola Ping-Pong.
Parecia uma competição desleal. Afinal, a RGE tinha os ?hits? do momento, Homem-Aranha, Hulk e os Quatro Fantásticos, protagonistas de desenhos animados, seriados de TV e até de um filme longa metragem (no final de 1979, ?A Vingança do Homem-Aranha? estreou nas telonas do Brasil para aproveitar o sucesso da série de TV, trazendo ? pasmem! - o episódio-piloto da mesma série). Porém, a Abril esmerava-se na qualidade de sua linha, principalmente no aspecto editorial. A tradução, a colorização, a diagramação, o papel, tudo era melhor. Sem falar na baderna que a RGE fazia na já problemática cronologia. Para vocês terem uma idéia, no mesmo mês, você lia histórias do Aranha namorando com Gwen Stacy (na revista Homem-Aranha) e com Mary Jane, anos depois da morte de Gwen (na revista Super-Heróis Marvel). Sem falar nas diversas ?splash pages? que nada mais eram que quadrinhos ampliados no tamanho de uma página inteira. Bizarro! Sem contar nas seções de carta, respondidas pelos próprios personagens: ?Hulk fica feliz que amiguinho compra sua revista?.
Superaventuras Marvel #1 |
E assim a coisa caminhou até 1982, quando a Abril lançou Superaventuras Marvel, abrigando Demolidor, Doutor Estranho, Pantera Negra e Conan, o Bárbaro. Na RGE, o tradicional Almanaque Marvel deu lugar ao Almanaque Premiere Marvel, que trazia histórias do Cavaleiro de Prata (?), ROM, Hércules e histórias da série ?E se??. Em dezembro daquele ano, saíram as ultimas edições de Hulk e Homem-Aranha, além do Almanaque do Hulk, já dominado pelo sucesso dos X-Men em suas três últimas edições.
Por volta do mês de maio de 1983, começaram a aparecer chamadas nas capas das revistas do Capitão América, como ?vem aí a revista do Aranha? e ?vem aí a revista do Hulk?. No editorial da seção de cartas de Heróis da TV # 48, de junho, veio o anúncio que muitos esperavam: Toda a linha Marvel Comics seria publicada pela Abril. Já no mês seguinte, chegaram às bancas, novamente, Homem-Aranha e O Incrível Hulk, com 84 páginas por edição, lombada quadrada (como ?Capitão?, ?Heróis? e ?Superaventuras?) e um álbum de figurinhas de brinde. Foi sensacional! Em setembro, saiu a primeira edição de Grandes Heróis Marvel, uma revista trimestral cuja proposta era trazer sempre grandes eventos. A estréia trouxe a conclusão da Saga de Adam Warlock e Thanos, com participação dos Vingadores. Um clássico incontestável da Marvel. Sem falar na bela iniciativa do hoje venerado ?Dicionário Marvel?, que vinha em cada uma das edições mensais. Aliás, naquela época, gibi tinha data certa pra chegar na banca: Heróis da TV abria o mês, dia 2; dia 9 chegava Superaventuras Marvel, dia 14 Homem-Aranha, no dia 20 era a vez do Capitão América e dia 26 o Hulk fechava a conta.
Os anos que seguiram foram pródigos ao apresentar novas séries aos leitores. E a Abril tirou a sorte grande ao pegar uma das melhores fases da história da editora: no mesmo mês você tinha X-Men de Claremont e Byrne, Demolidor do Frank Miller, Vingadores de Roy Thomas e Neal Adams, Capitão América também pelo Byrne, Hulk por Bill Mantlo e Sal Buscema, além do sucesso, galgado no filme, de Conan, que ganhou sua ?Espada Selvagem? em junho de 1984, revista que se tornou a mais vendida por muitos anos (cerca de 100.000 exemplares por edição!).
Frank Miller (Demolidor), John Byrne (X-Men), Neal Adams (Vingadores) e Sal Buscema (Hulk) |
Mas não apenas de êxitos viveu a editora da arvorezinha. A tentativa de lançar o material adulto e pouco convencional da Epic Comics, em agosto de 1985, falhou e a revista foi cancelada com apenas 6 edições. Já no final de 1986, os colecionadores viram a tal lombada quadrada sumir, e, pior, a diminuição do número de páginas de algumas revistas, como Capitão América, que das tradicionais 84 (desde a edição 29, quando se tornou ?Almanaque?) para 68. Tempos de recessão pós-Cruzado.
Heróis unidos nas Guerras Secretas |
Falando em 1986, não podemos esquecer que esse foi o ano em que a Abril fez uma de suas maiores prezepadas editoriais: Guerras Secretas. Além de ter sido a primeira mini-série da editora, a história que o leitor de 1986 leu não é a mesma que foi criada e publicada no EUA em 1984. Por motivos contratuais (a linha de brinquedos da série já estava sendo anunciada), a série teve que ser publicada antes do momento cronológico correto, o que levou os editores a fazer uma série de adaptações. Personagens foram apagados da história, plots descartados, numa verdadeira colcha de retalhos, mas que não diminuiu a diversão. Às vezes, a ignorância é uma benção!
Em 1987, foi a vez de lançar mais duas revistas, parte da linha Novo Universo Marvel: Justice e Força Psi. Mas como é raro alguma coisa dar certo aqui e não lá (exceção feita ao já citado Nova) as duas foram canceladas na 12ª edição, deixando um monte de perguntas sem resposta. Para compensar, tivemos cada vez mais mini-séries a partir de então, como Wolverine, Homem de Ferro, Thor, Elektra, e ainda o advento dos álbuns de luxo, as graphic novels, coisa impensável para aqueles que viram revistinhas sendo distribuídas em postos de gasolina. X-Men, Demolidor, Capitão Marvel e Homem-Aranha foram os pioneiros neste formatão aqui no Brasil.
Na próxima e derradeira parte da nossa jornada através da história da Marvel no Brasil, mostraremos como a Abril largou o osso 23 anos depois; e o nascimento da Era Panini, cujo editor Fernando Lopes nos concedeu uma entrevista EXCLUSIVA, que você confere logo abaixo. Até a próxima!
1) Como você se tornou editor da Marvel no Brasil?
Se eu fosse dado a acreditar nisso, diria que foi a maior sucessão de coincidências da minha vida. Se fosse mais místico, diria que foi destino. Como transito no nebuloso meio-termo entre uma coisa e outra, digo que foi um tremendo golpe de sorte. (risos) Veja bem, leio quadrinhos de super-heróis há mais de vinte anos. Adoro o gênero, acho-o muito divertido. Quando era garoto, ficava imaginando como seria trabalhar na área, mas nunca pensei que isso realmente viria a acontecer.
Se eu fosse dado a acreditar nisso, diria que foi a maior sucessão de coincidências da minha vida. Se fosse mais místico, diria que foi destino. Como transito no nebuloso meio-termo entre uma coisa e outra, digo que foi um tremendo golpe de sorte. (risos) Veja bem, leio quadrinhos de super-heróis há mais de vinte anos. Adoro o gênero, acho-o muito divertido. Quando era garoto, ficava imaginando como seria trabalhar na área, mas nunca pensei que isso realmente viria a acontecer.
Quando deixei meu último emprego, no qual fiquei cinco anos, resolvi tirar um tempo pra descansar (coisa que não fazia havia um bom tempo) e viajar. Duas semanas depois, já de volta a São Paulo, comecei a analisar minhas perspectivas profissionais. Estava dividido entre voltar à área de pré-impressão, na qual fiquei por sete anos, trabalhar como freelance na área de diagramação e assessoria de imprensa, na qual já tinha experiência, e voltar ao concorrido mercado editorial. Foi quando o Jotapê (Martins, na época um dos sócios da Via Lettera Editora), me chamou pra uma conversa. Queria trabalhar comigo, mas não conseguimos chegar a um acordo. Amigos, amigos, negócios à parte.(risos)
Ele então lembrou que o Helcio (de Carvalho, um dos sócios da Mythos Editora) estava procurando um editor pra nova linha de quadrinhos da Panini, que ia entrar no mercado com os títulos da Marvel. O Jota ligou pro Helcio e indicou meu nome. Acabei marcando uma entrevista e, no dia combinado, lá fui eu, de paletó e gravata, como qualquer candidato sério a um emprego que se preza. Quando o Helcio chegou, me cumprimentou e perguntou, baixinho, pra recepcionista: ?Quem é o vendedor?? (risos) Foi muito engraçado. Fiz a entrevista, o Helcio gostou dos meus textos, eu já tinha experiência prévia como editor de jornal na minha cidade (São Vicente, litoral de São Paulo) e acabei ficando com a vaga. E assim se vão mais de quatro anos. Às vezes, nem eu acredito. Num mês, eu era um leitor de quadrinhos como qualquer outro; no seguinte, era editor. Olhando em retrospecto, foi tudo muito rápido e inesperado.
2) Sabemos que você era fã de quadrinhos antes de virar editor, mas que sua preferência sempre foi a DC. O seu gosto mudou agora? Quais são, ao seu ver, as grandes diferenças entre linhas?
Capitão América assume a identidade de Nômade |
Bem, há um pequeno erro nessa crença de que eu sou decenauta desde criancinha... (risos) A bem da verdade, me apaixonei por quadrinhos de super-heróis com a Marvel. Eu devia ter uns dez ou onze anos quando vim passar férias na casa da minha tia, aqui em São Paulo, e peguei alguns gibis Marvel do meu primo pra ler. Acho que eram da RGE ou da Bloch, não tenho certeza, mas um deles trazia a aventura em que Steve Rogers abandona sua identidade de Capitão América pra se tornar o Nômade. Lembro que achei a história legalzinha e tal, mas nada que me tornasse um leitor instantaneamente.
Só fui comprar meu primeiro gibi de super-heróis anos mais tarde, aos 15 anos, com Superaventuras Marvel 28 (out/1984). Gostei das histórias do Luke Cage e da Sonja, dei a sorte de pegar as origens da Tropa Alfa do Byrne, mas fiquei impressionado mesmo foi com o Mestre do Kung Fu, do Doug Moench e Mike Zeck. Me fisgou mesmo.
Comprei a edição seguinte pra ver o final da história e dei de cara com a estréia da Viúva Negra, de Ralph Macchio e George Pérez, e com a história que, na minha opinião, selou meu destino de nerd inveterado: O Inferno Não Pode Esperar, de Chris Claremont e John Byrne. Aquele painel final, com o Wolverine olhando pra câmera e jurando vingança, é simplesmente animal! Naquele mês, comprei também Grandes Heróis Marvel #6, com o Mestre do Kung Fu... e o resto é história. Uma história de gastança sem fim, aliás. (risos)
Os Superamigos |
Comecei com a DC logo na seqüência, pra ver qual era a dos personagens da editora, que já conhecia de desenhos animados como Superamigos e As Aventuras de Batman e Robin, e do seriado live-action do Batman de 1966. Logo, estava consumindo tudo o que havia de ambos os universos. Comprava Super-Homem pelas aventuras da Legião dos Super-Heróis, Batman pelo próprio Morcegão e por Camelot 3000, Heróis em Ação por Novos Titãs e Esquadrão Atari.
Meu interesse pela DC aumentou bastante a partir de Crise nas Infinitas Terras. A idéia de um universo mais coeso me atraiu, e materiais como O Homem de Aço, de John Byrne (que me fez gostar do Superman, um personagem que até então eu achava um porre) e Batman: Ano Um, de Frank Miller, eram um indicativo de um novo e brilhante rumo.
Fora isso, tínhamos coisas como Cavaleiro das Trevas, revolucionária até hoje, Watchmen, Mundo Gavião, Falcão Negro, a minissérie (e posteriormente a revista) Os Caçadores, Monstro do Pântano, Homem-Animal. Foi uma época muito boa pros comics.
A principal responsável pelo aumento do meu interesse na DC foi a própria Marvel. No finalzinho dos anos 80 e início dos anos 90, as coisas começaram a ir irreversivelmente ladeira abaixo, e tudo começou, pra mim, justamente com os X-Men. A equipe nunca mais foi a mesma depois da saída do Byrne. Ainda teve uma fase legal com Paul Smith e tal, mas foi descambando inexoravelmente pro abismo. A entrada de Jim Lee, Mark Silvestri e companhia, que atraiu tantos novos leitores, foi pra mim a porta de saída. As tramas começaram mais a girar em torno do umbigo dos personagens do que nas aventuras em si, era uma ?megassaga? atrás da outra, um saco.
X-Factor de Peter David: oásis nos desérticos anos 90 |
Continuei a comprar os títulos X por muitos anos ainda (sim, eu tenho problemas), mas deixei de me importar com eles depois de Inferno. Nada do que se passou depois do Byrne, pra mim, como leitor, tem relevância, pelo menos até a fase do Grant Morrison. Salvo uma ou outra série esparsa ? X-Factor e Hulk do Peter David, Marvels, alguma coisa do início do título próprio do Wolverine, os Vingadores da Costa Oeste, Namor e Quarteto Fantástico do Byrne, Thor do Walt Simonson, por exemplo ?, a maior parte do que era publicado não passava de lixo. A quantidade de bons títulos DC, por outro lado, só fazia aumentar. E mesmo com inúmeras monstruosidades em seu currículo ? como Milênio, Zero Hora, A Morte do Super-Homem, A Queda do Morcego e várias outras ? o saldo ainda me parecia mais positivo.
A principal diferença entre Marvel e DC, ao meu ver, sempre foi a abordagem dos personagens, e isso só se acentuou com o tempo. Enquanto a DC centra fogo na ação heróica em si, desenvolvendo os personagens em segundo plano, a Marvel faz exatamente o inverso, focando mais a personalidade dos heróis diante dos desafios que enfrentam. A abordagem da DC tem maior chance de me agradar, pois a fórmula ?herói versus vilão? é bem mais fácil de seguir. Qualquer um razoavelmente competente escreve, no mínimo, uma boa historinha pra passar o tempo. A estratégia da Marvel é mais complicada, exige mais talento. Senão, você tem a história de um mala sem alça que vai te irritar até a raiz da alma. E eu não leio gibi pra me irritar.(risos)
Agora, dizer que meu gosto ?mudou? é meio complicado. Praticamente não leio mais gibis da DC há quase quatro anos, desde que me tornei editor. Não por falta de vontade, mas por falta de tempo mesmo. Sei que tem muito material excelente da DC saindo, e estou guardando todos os meus gibis pra ler um dia. Quem sabe quando eu me aposentar? (risos) Paralelamente, redescobri o prazer de ler algumas séries Marvel, e posso garantir que tem muita coisa boa sendo lançada. Num âmbito geral, acho que os quadrinhos vivem um momento excepcional, e fico feliz de estar no meio de tudo isso.
3) Qual a melhor parte do trabalho de editor? E a pior?
Capitão Marvel foi cancelado pro desespero dos leitores. E do Lopes. |
A melhor? Ler e ganhar gibi de graça! (risos) Sério, agora. A melhor parte é ver o leitor satisfeito, e o orgulho de saber que você contribuiu para aquele momento de satisfação, mesmo que só um pouquinho. Sabe, eu vou de metrô pro trabalho. Volta e meia, vejo alguém lendo um dos gibis que produzi. Sempre fico prestando muita atenção às reações da pessoa e, não raro, puxo papo pra perguntar a opinião dela sobre o gibi. Óbvio, muitos olham meio torto à princípio. O que deve ter de nego que pensa que é um assalto ou coisa do gênero não tá escrito. (risos) No geral, contudo, sempre consigo um bom retorno. Gosto muito do contato pessoal com o leitor, bem mais que do contato virtual. Também gosto muito de selecionar material pra publicar, de bolar novos jeitos de lançar mais revistas e de acertar as coisas pra que tudo saia redondinho.
A pior coisa são os erros. Fico pê da vida quando alguma coisa dá errado. Penso em todo o trabalho que se teve, o esforço de todos os envolvidos pra, no final, às vezes por um detalhe bobo, o resultado acabar comprometido... Sou um cara muito perfeccionista com meu trabalho, chato mesmo. Detesto erros, principalmente quando sinto que poderia ter feito algo pra impedir que eles acontecessem.
Jessica Jones, estrela de Alias. |
Com o tempo, consegui colocar na cabeça que, dado o volume de trabalho, alguma coisa sempre vai passar. Poxa, edito uma média de mil páginas por mês, às vezes mais. Seria muita pretensão da minha parte achar que não haveria erro em nenhuma delas. Mas acho que, dado o contexto, o índice de erros em nossas publicações é bem baixo. Uma margem de 1% a 2% é, na minha opinião, perfeitamente aceitável. Assim, tento encarar o assunto com serenidade.
Outra parte chata do trabalho é justamente o lado empresarial da coisa. Veja, quando um leitor chega pra mim e diz ?ah, vocês deviam publicar isso assim, assim e assado, cancelar este ou aquele título, fazer aquilo e aquilo outro?, ele leva em conta apenas seu próprio gosto pessoal. E está até certo, ao seu modo. Ele está vendo o lado dele, dane-se o resto do mundo. Eu já não posso fazer isso.
Não faço gibis pra mim, mas para os mais variados tipos de leitores. Mais do que isso: faço revistas para vender, tenho uma responsabilidade para com a empresa. Se uma publicação não vende, é cancelada e todo mundo sai perdendo. Não tem coisa mais triste do que cancelar um título. Toda vez que me vi na iminência desse tipo de fato, fiz o possível pra acomodar os interesses de todo mundo. Tanto é que pouquíssimas séries foram efetivamente interrompidas com os eventuais cancelamentos que tivemos no caminho. Tivemos algumas baixas, claro, e algumas que me deixaram particularmente chateado, mas preciso ser profissional. É pra isso que sou pago, e é com isso que sustento minha família.
4) Qual foi o seu maior orgulho profissional como editor da Marvel? E o maior desgosto?
Cage, de BrianAzzarello e Richard Corben. |
No geral, me orgulho muito do que conseguimos nos últimos quatro anos. Não eu, em especial, porque não estou nessa sozinho. Há muita gente envolvida no processo e, se a Panini é a potência editorial na área de quadrinhos que é hoje, o é graças a um trabalho de equipe. Quando começamos, em janeiro de 2002, éramos uma incógnita, ninguém sabia o que esperar. Substituímos a maior editora do País na publicação dos quadrinhos Marvel. Tínhamos de mostrar que estávamos à altura de uma estrutura com mais de 20 anos de tradição. Mais do que isso, tínhamos de ser melhores.
Começamos com seis títulos mensais, um editor meio inexperiente nessa área específica, uma equipe exígua e uma pressão enorme. Mais de uma vez ouvi que a gente não agüentava seis meses. Mas nós tínhamos uma coisa com a qual muitos não contavam: gana. Tínhamos e temos uma vontade maluca de fazer cada vez mais, e cada vez melhor. Vamos errar, claro, mas nunca poderão nos acusar de não tentar. Talvez por isso a Panini seja o que é hoje e tenha uma presença tão marcante nas bancas.
Tenho, claro, aquilo que considero minhas pequenas vitórias pessoais. A principal delas foi conseguido trazer material que, em outras épocas, dificilmente chegaria às bancas. Particularmente, do jeito que as coisas vinham vindo, duvido que séries como Alias, Cage, Nascido Para Matar, Thor: Vikings, Viúva Negra, X-Force/X-Táticos e mesmo Poder Supremo chegassem às mãos dos leitores brasileiros. Tenho muito orgulho de ter ajudado a trazer esse material pra cá. E, tirando X-Force/X-Táticos ? uma brisa de renovação no universo mutante ? todas as demais séries só viram a luz do dia por aqui graças a uma arriscada aposta chamada Marvel MAX. Taí um título que posso dizer, com orgulho, que saiu da minha cabeça, no qual ninguém acreditava a princípio. Para minha sorte (e dos leitores), a Panini decidiu bancar a aposta. E Marvel MAX continua aí até hoje, enquanto outras revistas, teoricamente mais fortes, acabaram tendo de ser reformuladas.
Meu maior desgosto? Interromper a série do Capitão Marvel. Eu gostava mesmo dela. Pena que não vendia...
5) Qual o seu personagem favorito (na Marvel)? E sua história favorita (também na Marvel)?
Demolidor: o preferido de Lopes |
Gosto mais dos heróis de segundo e terceiro escalão da Marvel do que dos big guns. Se tivesse de escolher um e apenas um, seria o Demolidor. Mas também curto caras como Punho de Ferro, Mestre do Kung Fu e Jessica Jones, minha personagem feminina favorita desde Alias.
História favorita é difícil dizer. Uma das que mais me marcou foi Roleta Russa, do Demolidor, ainda na primeira fase do Miller. Como é uma das mais antigas, acho que posso eleger essa. Mas tem um monte, muitas das quais tive a sorte de publicar.
6) O futuro da Marvel no Brasil. É promissor? Fale um pouco sobre o que vem por aí.
Acho que vivemos um bom momento, tanto para a Marvel quanto pra DC, e creio que ele deve se estender por um bom tempo ainda. Ambas as editoras estão se esforçando pra conquistar novos leitores, e isso é bom pro mercado e pra todo mundo. Como mencionei antes, começamos nossa trajetória com seis títulos mensais. Hoje temos dez revistas mensais pros mais variados tipos de público, uma bimestral, uma média de três a quatro encadernados por semestre, três minisséries em andamento e vamos começar a publicação de anuais. Posso afirmar, sem medo de errar, que nunca se publicou tanto material Marvel regularmente no Brasil como agora. E, no que depender de nós, teremos ainda mais.
Acho que vivemos um bom momento, tanto para a Marvel quanto pra DC, e creio que ele deve se estender por um bom tempo ainda. Ambas as editoras estão se esforçando pra conquistar novos leitores, e isso é bom pro mercado e pra todo mundo. Como mencionei antes, começamos nossa trajetória com seis títulos mensais. Hoje temos dez revistas mensais pros mais variados tipos de público, uma bimestral, uma média de três a quatro encadernados por semestre, três minisséries em andamento e vamos começar a publicação de anuais. Posso afirmar, sem medo de errar, que nunca se publicou tanto material Marvel regularmente no Brasil como agora. E, no que depender de nós, teremos ainda mais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário