PROJETO DE MARCOS DO PSOL CRIA O DIA DO QUADRINHO POTIGUAR
A data é uma homenagem ao nascimento do professor e poeta Moacy Cirne, o maior estudioso de arte sequencial no Brasil
O vereador Marcos Antônio (PSOL) é o autor do projeto de lei que institui o Dia do Quadrinho Potiguar no Município de Natal. A data defendida pelo parlamentar é 13 de março, numa referência ao natalício do saudoso poeta, artista visual e professor Moacy Cirne (1943-2014), nascido em São José do Seridó e considerado o maior estudioso brasileiro das histórias em quadrinhos (HQs), tendo escrito inúmeros livros sobre o assunto.
O projeto tramitará nas comissões. Em seguida, será encaminhado ao plenário para votação.
O projeto tramitará nas comissões. Em seguida, será encaminhado ao plenário para votação.
O parlamentar do PSOL (ACIMA) justifica que o intuito do seu projeto é criar uma referência da chamada nona arte na capital potiguar, como forma de fomentar a produção de arte sequencial local que vem ocorrendo nos últimos anos, principalmente com os chamados independentes. “O objetivo é estimular e investir na formação de um novo público leitor, além de contribuir para um mercado que não para de crescer. Para isso, se torna importante inserir a data no calendário cultural do município de Natal”, disse.
A produção de Arte Sequencial no Município de Natal hoje é um fato consolidado – vide as recentes publicações do coletivo K-Ótica, Jovens Escribas, Grupehq (desde os anos de 1970), a instalação da escola Quadrinhos Estúdio, entre outros. Para tanto, se faz necessário divulgar mais essa produção local. E, além de eventos de lançamentos na área, se torna importante também instituir uma data que celebre esse movimento na capital potiguar. Com isso, estará estimulando o surgimento de novos leitores.
A linguagem das histórias em quadrinhos se espalhou pelo mundo e hoje é utilizada em diversas formas de arte e comunicação, incluindo biografias, cinema, televisão e publicidade. Por isso, o gênero é considerado a Nona Arte.
As histórias em quadrinhos constituem um meio de comunicação de massa que agrega dois códigos distintos para transmitir a mensagem: o linguístico – texto – e o pictórico – imagem. No Brasil, vários artistas representam a categoria HQ.
EDUCAÇÃO
Além disso, no tocante à educação, as histórias em quadrinhos hoje são utilizadas como um excelente recurso de aprendizado em sala de aula. As HQs ajudam na alfabetização e também a despertar o interesse pela leitura e pela escrita nas crianças, pois une palavra e imagem. Através da sua narrativa em quadros, mesmo a criança não alfabetizada consegue compreender a história através do recurso da imagem. Isso sem falar nos aspectos lúdicos que atraem os estudantes, como cores, onomatopeias, personagens e traços, convidando-os a criar sua própria história.
Por isso, a importância de se instituir uma data para celebrar esse movimento artístico na capital do RN. No Brasil, já existe o Dia do Quadrinho Nacional, que é 30 de janeiro, instituído no ano de 1984, numa referência a data da primeira HQ publicada em terras tupiniquins, no ano de 1869, pelo cartunista italiano radicado brasileiro, Angelo Agostini.
SOBRE MOACY CIRNE
Moacy Cirne saiu ainda muito jovem do sertão do Seridó para se tornar uma referência nos movimentos culturais do Rio Grande do Norte e do Rio de Janeiro, nas décadas de 1960 e 1970. Considerado o maior estudioso brasileiro das histórias em quadrinhos (HQs), tendo escrito inúmeros livros sobre o assunto, Moacy Cirne também foi um dos fundadores do movimento cultural denominado poema/processo.
Sua intensa participação como ativista cultural ainda inclui a participação na fundação do Cineclube Tirol e da instauração do Cinema de Arte de Natal e, em escala menor, da Associação Brasileira de Semiótica/RJ.
Era professor-aposentado do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Moacy da Costa Cirne nasceu no dia 13 de março de 1943, no sítio Caatinga Grande, em São José do Seridó, que na época era distrito de São José do Seridó. Era filho do comerciante Luiz da Costa Cirne e de Nady da Silva Cirne. São seus irmãos: (da primeira família) Nilton, Lourdinha, Elizabete, Ziuna; (da segunda família) Helena, Henrique, George, Eloísa e Cirne Júnior. O contato com a revista Tico-Tico, a primeira a publicar revistas em quadrinhos no Brasil, o estimulou a ter contato com o mundo da leitura, por volta de 1948. Tratava-se de um interesse puramente lúdico-afetivo. O Tico-Tico, por exemplo, representava todo um mundo para o menino Moacy.
Dona Nady, sua mãe, lia a publicação e ao mesmo tempo procurava ensinar ao pequeno Moacy o domínio das primeiras letras. Ela deveria saber que ler era um dos melhores meios de aquisição de conhecimento. Já dominando os códigos da escrita do alfabeto, foi estudar o primário numa escola particular de Tereza Mota, em Caicó, na Rua do Serrote (ou Rua Marinheiro Fernando).
A conclusão do primário se deu no Externato São Luiz, de dona Lourdes (que se localizava na praça da Igreja do Rosário). De lá, fez o ginasial no GDS (Ginásio Diocesano Seridoense), em 1956. No ano seguinte, a família de Moacy se mudou para Natal. Na capital, estudou no Colégio Santo Antônio (Marista), no período de 1958/59. Ao retornar para Caicó, concluiu o ginásio no GDS.
Em 1960, regressou para a capital e cursou o colegial (ou científico) no Colégio Marista, concluindo em 1963. Um ano depois, ingressou na Faculdade de Direito, na Ribeira, na ocasião em que foi aluno de Edgar Barbosa e Alvamar Furtado. Por não se identificar com o curso que aborda as normas de conduta de regulação das relações sociais, abandonou-o logo no início.
Com “a cara e a coragem”, viajou para o Rio de Janeiro, em 1967, e passou a dividir um quarto, no bairro da Glória (localizado entre o centro e Flamengo), com o jornalista Djair Pereira Dantas; e, mais tarde, um apartamento, com outro amigo. Antes, óbvio, fez contatos e, chegando em solo carioca, passou a trabalhar na revisão de textos de livros para editoras. Lá, havia dois grupos de amigos seus: os do Rio e os de Natal, que se encontravam em terras fluminenses.
Foi no Rio de Janeiro que Cirne se envolveu com o grupo da Semiótica e Comunicação, participando do lançamento do poema/processo (em Natal e no Rio de Janeiro), movimento de vanguarda literária próxima das artes plásticas, ao lado de Wlademir Dias-Pino, Alvaro de Sá, Décio Pignatari, Neide Dias de Sá, Anselmo Santos, Dailor Varela, Anchieta Fernandes, Falves Silva, Nei Leandro de Castro, Sanderson Negreiros, Pedro Bertolino, Hugo Mund Jr. e outros.
Ao se interessar por histórias em quadrinhos, passou a ler livros franceses sobre o tema, pois naquela época a França estava no auge da teoria de quadrinhos, seguida pela Espanha e Itália. Moacy Cirne percebeu que os quadrinhos ultrapassavam as fronteiras da própria indústria cultural, enquanto linguagem, e que poderiam se transformar em pesquisa acadêmica.
Na década de 1970, escreveu a coluna EQ, juntamente com Marcio Ehrlich, no jornal carioca Tribuna da Imprensa. Foi editor da Revista de Cultura Vozes, de Petrópolis (1971-1980), e colaborador do suplemento Livro, do Jornal do Brasil (Rio, 1972-76). Ao ingressar na UFF, no Departamento de Comunicação Social, em 1971, foi professor assistente do cineasta Nelson Pereira dos Santos.
Moacy Cirne começou lecionando a disciplina “Introdução à História da Comunicação”; depois, ao lançar dois livros sobre arte seqüencial – “A Explosão Criativa dos Quadrinhos (1970) e Para ler os quadrinhos (1972) – criou, em 1972, a “Introdução às Histórias em Quadrinhos”, sendo o pioneiro em Niterói – a primeira disciplina nesta área foi criada em Brasília, pelo professor gaúcho Francisco Araújo, da UNB.
Era famoso no Instituto de Arte e Comunicação Social da UFF por editar e distribuir o fanzine independente de uma página, chamado “Balaio Porreta”. Cirne costumava organizar comemorações chamadas "Balaiadas" com distribuição de brindes como livros de arte e poesia entre os alunos do curso de Comunicação Social da UFF, para divulgar as edições especiais do Balaio. Desde 2007, o fanzine, que une textos provocativos, listagens de filmes, pensamentos e poesias, se transferiu para a internet sob a forma de um blog, o Balaio Vermelho.
Apesar de ser uma referência na teorização da linguagem visual da arte sequencial no Brasil, Moacy confessou, em entrevista concedida no final de 2012, ao repórter Rômulo Estânrley, que leu poucas revistas em quadrinhos e se concentrou mais na literatura. Ele definiu esse período de “fase besta”, por não ter lido HQs como deveria, que em sua opinião são tão importantes quanto a literatura, embora em níveis diferentes.
Influenciado pela leitura dos livros de Jorge Amado e Karl Marx, passou a militar na esquerda, através da Organização de Combate Marxista-Leninista – Política Operária (OCML-PO), no Rio de Janeiro. “Fui perseguido, mas nunca me pegaram, pois eu não era da linha de frente. Era apenas um intelectual de esquerda, que ficava na retaguarda”, explicou.
Quando começou a teorizar sobre quadrinhos não sofreu nenhum tipo de preconceito. Mas havia pessoas que não davam importância ao tema. Já em São Paulo, havia aquelas que estavam interessadas no assunto, mas só que em leituras factuais sobre HQs – e não na sua teorização.
O escritor casou por três ocasiões – da primeira vez, com Maria de Jesus; da segunda, com Ana Léia, com quem teve as filhas Ana Morena e Isadora; e da terceira, com a professora universitária Fátima Arruda.
Autor de cerca de dez livros sobre quadrinhos, em que faz uma abordagem ideológica, admitia que a contribuição dos comics norte-americanos resida na parte gráfica – os EUA são para muitos o berço do quadrinho como conhecemos hoje.
Moacy Cirne faleceu em 11 de janeiro de 2014, após descobrir um câncer de fígado, no final de 2013, do qual começou a se tratar, passando por um procedimento cirúrgico. Pouco tempo depois da operação, teve uma parada cardíaca, ficando em coma induzido por pouco tempo, ao que não resistiu e morreu, no Hospital da Unimed, em Natal.
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