domingo, 8 de abril de 2012

Busca da felicidade

Por Diário do Nordeste
Um tema universal ganha traços cearenses em três histórias em quadrinhos de Júlio Belo, reunidas em livro

Júlio Belo teve que passar cinco meses trabalhando na cidade Granja, no Ceará. Da temporada no Interior, trouxe não apenas a experiência profissional, mas uma história em quadrinhos. "Sou muito observador e gosto de tirar o melhor de cada lugar", diz. Assim, logo a história se juntou a outras duas, passadas em Fortaleza, compondo o livro "Cada um a seu modo".

A empatia do leitor com a obra é praticamente imediata. São três contos de leitura rápida e fácil sobre algo que é comum à vida de todos: a procura pela felicidade. Em "Sofia", ela está nos pequenos momentos, na ansiedade gerada pelo retorno de viagem do pai. Em "50 por hora" é moldada pelo medo da solidão. Já "A frase riscada" trata de escolhas, consequências e relembranças.
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É possível reconhecer nos traços do quadrinhista Júlio Belo as paisagens da Capital e do interior...
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... o aeroporto e até mesmo características físicas e roupas dos personagens

Não espere de "Cada um a seu modo" heróis, sagas ou epopeias monumentais. Os personagens tocam o leitor justamente por serem pessoas comuns em narrativas normais - o que a torna uma obra atemporal e identificada com o público amplo. Isso explica porque, embora sejam ambientadas em Fortaleza e Granja, poderiam ser lidas sem prejuízo de significado em qualquer lugar do mundo.

Entretanto, para quem mora no Ceará, há um gosto especial nas histórias. É possível reconhecer nos traços de Belo as paisagens da Capital e do Interior, o aeroporto e até mesmo características físicas e roupas dos personagens. A moça de cabelos crespos presos, legging e chinelos de dedo, por exemplo, provavelmente parecerá familiar.

"Eu busco, como artista, retratar minha comunidade. Que credibilidade teria escrever uma história que se passa no Ceará com personagens de traços europeus ou norte-americanos?", questiona Júlio, que afirma ter a preocupação de criar no leitor local essa identificação com a cidade em que vive. Daí fica mais fácil compreender a importância que dá à observação para a criação das histórias.

Aos 32 anos, Júlio Belo é formado em Ciências Contábeis e trabalha em um banco em Fortaleza. Sua relação com o desenho é mais antiga. Na década de 90 já fazia seus primeiros trabalhos de forma independente. Autodidata, teve uma rápida passagem pela Oficina de Quadrinhos da UFC (Universidade Federal do Ceará), mas nunca fez um curso de desenho.

Entre os artistas que o influenciam cita Moebius, um dos pseudônimos do francês Jean Giraud, morto recentemente, e o belga Hergé, famoso por "As aventuras de Tintim". Esta última referência é visível na narrativa em linhas claras de "Cada um a seu modo". "É um traço simples, mas expressivo, ao qual acrescento algumas linhas de expressão e também outros enquadramentos", conta.

O traço de Júlio Belo traz um resultado leve e permite desenvolver cenários de forma limpa e detalhada, seja na representação de um casario em Granja, nos ambientes do aeroporto ou no microuniverso do quarto de Sofia. Ao falar do primeiro conto, cabe um outro destaque: o enquadramento, quase sempre no nível da perspectiva infantil.

Incentivo aos quadrinhos
"Cada um a seu modo" faz parte de um grupo de projetos pioneiros de HQs que conseguiram se bancar com o apoio de leis de incentivo, que até então ignoravam o gênero. Júlio trabalha no Banco do Nordeste, que entre diversas linhas, oferece uma exclusiva para funcionários.
Seu projeto de livro em formato de quadrinhos foi um dos contemplados pelo edital interno da instituição, que financiou a primeira tiragem, de 1 mil exemplares.

No caso do Banco do Nordeste, os projetos de quadrinhos concorreram junto com os demais na categoria literatura. O gênero, porém, teve categoria própria no edital Prêmio Literário para Autores Cearenses, da Secult (Secretaria de Cultura do Estado do Ceará), de 2010, que selecionou como vencedor "Ariosto - A evolução natural do conquistador", de João Belo Jr.

Júlio e João Belo são irmãos e criaram o site The Comics Cafe (www.thecomicscafe.com), em 2009, junto com Falex Vidal (conhecido pela Central do Rato, no finado site Underweb). "O objetivo era manter um espaço para a produção e divulgação do nosso material, visando a publicação, seja por editoras ou por edital", explica Júlio. A revista Rato do Prédio, de Falex, primeiro projeto lançado pelo selo, exigiu que o grupo rachasse os custos.

No Comics Café, que funciona como portfólio virtual do trio, o leitor encontra ilustrações, imagens dos bastidores e notícias relacionadas a HQs, além de uma loja virtual para venda de produtos do grupo. Foi por meio dele que o cartunista paulista Caco Galhardo conheceu o trabalho de Júlio, João e Falex e convidou o trio a expor no Risadaria, maior festival de humor da América Latina, que aconteceu em São Paulo na semana passada. O grupo não participou pessoalmente do evento, mas enviou amostras do trabalho e fez alguns contatos virtuais.
LIVRO
Cada um a seu modo
Júlio Belo- The Comics café/BNB-2012, 68 páginas- R$ 25

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