Por Milena Azevedo - GHQ
Faz tempo que me incomoda ver a forma estereotipada do “fanboy” retratada pelo cinema atual. Em especial aquele fã de quadrinhos e cultura pop que já adulto cria um personagem em sua cabeça e, trajado a caráter, parte para a ação.
É comum o cinema apresentar esses protagonistas como losers/freaks vítimas bullying ou rapazes com algum tipo de problema mental, ridicularizando-os em caracterizações clichê (mesmo que sejam interpretados por atores bonitos e carismáticos, como Ryan Kwanten, o Jason Stackhouse da série True Blood).
Sem o desenvolvimento de uma estrutura mais complexa, os personagens são unidimensionais e rasos, causando pouca empatia no espectador, que, em geral, ou sente compaixão ou total indiferença por eles.
Os protagonistas de Defendor (2009) e Griff – o invisível (2010) tem distúrbios psicológicos e, ingenuamente, atuam como vigilantes mascarados repletos de gadgets, achando que estão defendendo seus respectivos bairros dos bandidos. O Frank Darrbo (maravilhosamente interpretado por Rainn Wilson) de Super (2010) é aquele sujeito boa praça e apatetado que, ao perder sua esposa para um traficante de drogas, deixa o “bom mocismo” de lado e se transforma no super-herói The Crimson Bolt, contando com a ajuda da sidekick Boltie (Ellen Page). E em Boy Wonder (2010) – único thriller dramático entre os filmes selecionados –, um jovem perturbado pelo assassinato da mãe faz “pinturas de guerra no rosto” e passa as noites rondando os bairros de Nova Iorque com o objetivo de dar uma lição nos marginais (apanhando bastante também). Durante o dia, ele se reveza entre os estudos puxados e as idas à delegacia para rastrear o possível assassino. O título do filme (Garoto Prodígio, numa tradução literal) faz referência à alcunha do Robin, embora o protagonista esteja mais para Batman.
No caso desses quatro filmes, nem dá para culpar o diretor por alguma mudança no roteiro, pois cada um dos quatro foi escrito e dirigido pela mesma pessoa (Peter Stebbings, Leon Ford, James Gunn e Michael Morrissey, respectivamente).
O pior acontece em Griff – o invisível, quando o personagem de Ryan Kwanten é forçado a encarar a verdade dos fatos e passa a simular um comportamento “normal”, mostrando “amadurecimento”. No final, é convencido pela namorada freak que eles são iguais, pois veem o mundo de um jeito diferente. Griff “regride” para poder ficar com ela.
Já pararam pra pensar por que no filme Kick Ass – Quebrando Tudo (2010) quem rouba a cena é a Hit Girl?
Em contrapartida, o cinema sul-coreano nos dá um protagonista com caracterização semelhante, mas extremamente bem construído.
Em O Homem que era o Super-Homem (2008), vemos um homem que diz ser o verdadeiro Super-Homem e sua vida se resume a salvar a vida dos outros. Ele é mentalmente perturbado, mas a história sobre o que o deixou assim é apresentada em flashbacks que entrecortam a trama principal. O espectador descobre a verdade junto com a cineasta que está fazendo um documentário sobre ele. Caracterização e personagem se diferem, construindo um protagonista multidimensional, com o qual é fácil se identificar e torcer a favor.
Não estou afirmando que os filmes ocidentais supracitados sejam ruins, apenas condeno a estereotipação de quem curte quadrinhos (seja adolescente ou adulto) como seres esquisitos, ingênuos, perturbados.
Generalizar um grupo por deveras heterogêneo apenas estimula o preconceito e dá pano pra manga da mídia torpe tomar fanboys, gamers e rpgistas como bodes expiatórios de eventos violentos que choquem a opinião pública.
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