Cris Peter está concorrendo na categoria de melhor colorista do EisnerPor Guilherme Rosa - Galileu
Na tarde da quarta-feira, dia 4 de abril, a gaúcha Cris Peter foi anunciada como uma das concorrentes ao prêmio Eisner, o Oscar dosquadrinhos. Outros artistas brasileiros já foram indicados - e ganharam - mas é a primeira vez que uma brasileira concorre. Cris é colorista, já deu cores a revistas tanto da Marvel quanto da DC Comics, as duas maiores editoras de HQ dos Estados Unidos.
Ela está sendo indicada por seu trabalho na sérieCasanova, que conta a história de um ladrão envolvido no mundo da superespionagem. A HQ foi lançada originalmente em 2006, e foi escrita pelo roteirista Matt Fraction e desenhada pelos gêmeos Gabriel Bá e Fábio Moon em formato preto e branco. Agora, as revistas estão sendo relançadas pela Marvel Comics, em seu selo Icon, para HQs autorais. Cris foi chamada para colorir a série, e está sendo indicada ao prêmio pelo seu trabalho no segundo arco: Gula. O resultado deve sair em julho.
Página da revista Casanova, desenhada por Fábio Moon. (Crédito: Marvel/ Divulgação)
A GALILEU conversou por telefone com Cris Peter, que falou sobre sua indicação ao prêmio, sua carreira e o trabalho de colorização. Veja a entrevista a seguir:
Como você recebeu a notícia de que está concorrendo ao Eisner?
Na verdade, eu estou sabendo desde segunda-feira. O Matt Fraction, escritor do Casanova, comunicou a equipe toda por email. Eu estava guardando esse segredo. Mas eu não estava acreditando até ver hoje que era oficial. Agora que caiu a ficha mesmo.
Já deu tempo de comemorar?
Estou tão cheia de trabalho que nem deu pra sair pra comemorar ainda. Não sei nem se vou conseguir essa semana. Estou fazendo a ultima edição do terceiro arco do Casanova. Nós queremos que a revista saia logo, pra lançarmos o encadernado em julho. A série fala dos 7 pecados capitais. Cada pecado é um arco de 4 edições. Estou fazendo a última edição do terceiro arco.
Quais desses arcos já tinham saído antes?
O primeiro que saiu foi o Luxúria, desenhado pela Bá. Depois saiu o Gula, que é o que está concorrendo ao prêmio, desenhado pelo Fábio Moon. Eles já tinham sido lançados em 2006, só que em preto e branco. Agora relançamos colorido.
As histórias a partir desse terceiro arco serão inéditas?
Sim. O próximo será desenhado pelo Gabriel Bá. Os gêmeos estão fazendo um trabalho de revezamento entre os arcos.
Como você recebeu a notícia de que está concorrendo ao Eisner?
Na verdade, eu estou sabendo desde segunda-feira. O Matt Fraction, escritor do Casanova, comunicou a equipe toda por email. Eu estava guardando esse segredo. Mas eu não estava acreditando até ver hoje que era oficial. Agora que caiu a ficha mesmo.
Já deu tempo de comemorar?
Estou tão cheia de trabalho que nem deu pra sair pra comemorar ainda. Não sei nem se vou conseguir essa semana. Estou fazendo a ultima edição do terceiro arco do Casanova. Nós queremos que a revista saia logo, pra lançarmos o encadernado em julho. A série fala dos 7 pecados capitais. Cada pecado é um arco de 4 edições. Estou fazendo a última edição do terceiro arco.
Quais desses arcos já tinham saído antes?
O primeiro que saiu foi o Luxúria, desenhado pela Bá. Depois saiu o Gula, que é o que está concorrendo ao prêmio, desenhado pelo Fábio Moon. Eles já tinham sido lançados em 2006, só que em preto e branco. Agora relançamos colorido.
As histórias a partir desse terceiro arco serão inéditas?
Sim. O próximo será desenhado pelo Gabriel Bá. Os gêmeos estão fazendo um trabalho de revezamento entre os arcos.
Página de Casanova, desenhada por Gabriel Bá. (Crédito: Marvel / Divulgação)
E como você começou nos quadrinhos?
Entrei nesse mundo por outro caminho. Eu sempre fui muito fã de desenhos animados, na verdade. Comecei vendo Cavaleiros do Zodíaco, esse tipo de coisa. Quando minha mãe viu que tinha uma oficina de quadrinhos num museu de arte aqui no Rio Grande do Sul, ela sugeriu que eu me inscrevesse. Foi aí que tomei conhecimento do cenário dos quadrinhos. Eu tinha uns 15 anos. Formamos um grupo de amigos, que continuou se vendo depois do fim do curso. Éramos vários artistas, dentre eles o Rafael Albuquerque, que ganhou o Eisner ano passado. Até que esse grupo resolveu levar a coisa mais a sério, começou a lançar fanzines, a colocar o trabalho na internet. Eu estava nessa de gaiato, só porque era amiga deles.
Como o volume de trabalho deles ficou grande, começaram a me pedir ajuda para fazer o trabalho de colorização, já que meu desenho ainda estava imaturo. Fiquei trabalhando nisso até 2004, quando entrei na faculdade achando que ia ser publicitária. Continuei fazendo uns bicos pra ganhar uma grana. Quando comecei a comparar o mercado de quadrinhos com o de publicidade, vi o quanto era vantajoso e quanto tinha futuro esse história de ser colorista de HQ.
E como acabou se profissionalizando?
Foi a partir de 2004 que comecei a estudar mesmo. Eu cursei a faculdade até o final, mas me foquei muito nas matérias que me interessavam como colorista: composição de cores, cor na comunicação. Minha monografia foi voltada totalmente para a cor na comunicação das histórias em quadrinhos. Foi quando comecei a estudar todo processo de colorização, as técnicas. Me especializei nessa área.
E quando você começou a fazer trabalhos para fora do país?
Isso foi antes mesmo da faculdade. Lá por 2001, nosso grupo de amigos começou a divulgar o trabalho pela internet e entramos em contato com uma editora do oriente médio. Era uma editora egípcia chamada A.K. Comics. Começamos a fazer super-heróis árabes! Através dessa oportunidade, visitamos as convenções nos EUA. A primeira vez que fui pra San Diego foi em 2005 [a San Diego Comic-Con é a maior convenção de HQs dos EUA]. Foi lá que começamos a apertar a mão dos editores, conhecer os artistas americanos, apresentar nosso trabalho. Foi assim que conseguimos abrir espaço, uma brecha pra entrar nesse mercado.
Esse trabalho nas convenções é importante?
Com certeza. Apertar a mão, se apresentar, olhar olho no olho dos editores, mostrar seu trabalho, é fundamental. Por isso, tem muito artista que contrata agentes, porque não têm condições de ir pessoalmente, e o agente acaba fazendo isso. São poucas pessoas que têm essa oportunidade que eu tive.
E como começou a trabalhar para as grandes editoras, como Marvel e DC?
Fiz vários trabalhinhos pequenos para elas. Meu primeiro grande trabalho pra DC Comics foi na revista Superman/Batman. Fiz duas edições. Era uma história com as versões mirins dos personagens. As versões grandes e as versões pequenas se encontravam. Foi meu primeiro trabalho grande. Depois, em 2010, eu comecei a trabalhar no Casanova. No ano passado, eu peguei uma edição com o Daken, o filho do Wolverine. Agora estou trabalhando num novo título pra Marvel, com super-heróis conhecidos, que apareceram em filmes. Mas não sei se posso falar mais. É a primeira edição, então é melhor eu não falar nada. Vou ficar quietinha.
Você já tinha trabalhado com algum dos gêmeos antes?
Nunca. A gente se encontrava em convenções. E é muito engraçado ver os brasileiros se encontrando nessas convenções. Nós somos um público a parte. Quando nos encontramos, todo mundo é amigo - o Ivan Reis, o Joe Prado, o Renato Guedes. A gente faz uma festa por lá, as pessoas já percebem: “lá vêm os brasileiros’. Eu conheci os gêmeos nessas convenções. Mas foi uma grande surpresa quando eles entraram em contato comigo. Um dia eu estava feliz na minha casa, e o Gabriel me ligou me convidando para trabalhar. Eu achei o máximo, porque já tinha comprado a revista quando saiu em preto e branco. Achei muito legal.
Entrei nesse mundo por outro caminho. Eu sempre fui muito fã de desenhos animados, na verdade. Comecei vendo Cavaleiros do Zodíaco, esse tipo de coisa. Quando minha mãe viu que tinha uma oficina de quadrinhos num museu de arte aqui no Rio Grande do Sul, ela sugeriu que eu me inscrevesse. Foi aí que tomei conhecimento do cenário dos quadrinhos. Eu tinha uns 15 anos. Formamos um grupo de amigos, que continuou se vendo depois do fim do curso. Éramos vários artistas, dentre eles o Rafael Albuquerque, que ganhou o Eisner ano passado. Até que esse grupo resolveu levar a coisa mais a sério, começou a lançar fanzines, a colocar o trabalho na internet. Eu estava nessa de gaiato, só porque era amiga deles.
Como o volume de trabalho deles ficou grande, começaram a me pedir ajuda para fazer o trabalho de colorização, já que meu desenho ainda estava imaturo. Fiquei trabalhando nisso até 2004, quando entrei na faculdade achando que ia ser publicitária. Continuei fazendo uns bicos pra ganhar uma grana. Quando comecei a comparar o mercado de quadrinhos com o de publicidade, vi o quanto era vantajoso e quanto tinha futuro esse história de ser colorista de HQ.
E como acabou se profissionalizando?
Foi a partir de 2004 que comecei a estudar mesmo. Eu cursei a faculdade até o final, mas me foquei muito nas matérias que me interessavam como colorista: composição de cores, cor na comunicação. Minha monografia foi voltada totalmente para a cor na comunicação das histórias em quadrinhos. Foi quando comecei a estudar todo processo de colorização, as técnicas. Me especializei nessa área.
E quando você começou a fazer trabalhos para fora do país?
Isso foi antes mesmo da faculdade. Lá por 2001, nosso grupo de amigos começou a divulgar o trabalho pela internet e entramos em contato com uma editora do oriente médio. Era uma editora egípcia chamada A.K. Comics. Começamos a fazer super-heróis árabes! Através dessa oportunidade, visitamos as convenções nos EUA. A primeira vez que fui pra San Diego foi em 2005 [a San Diego Comic-Con é a maior convenção de HQs dos EUA]. Foi lá que começamos a apertar a mão dos editores, conhecer os artistas americanos, apresentar nosso trabalho. Foi assim que conseguimos abrir espaço, uma brecha pra entrar nesse mercado.
Esse trabalho nas convenções é importante?
Com certeza. Apertar a mão, se apresentar, olhar olho no olho dos editores, mostrar seu trabalho, é fundamental. Por isso, tem muito artista que contrata agentes, porque não têm condições de ir pessoalmente, e o agente acaba fazendo isso. São poucas pessoas que têm essa oportunidade que eu tive.
E como começou a trabalhar para as grandes editoras, como Marvel e DC?
Fiz vários trabalhinhos pequenos para elas. Meu primeiro grande trabalho pra DC Comics foi na revista Superman/Batman. Fiz duas edições. Era uma história com as versões mirins dos personagens. As versões grandes e as versões pequenas se encontravam. Foi meu primeiro trabalho grande. Depois, em 2010, eu comecei a trabalhar no Casanova. No ano passado, eu peguei uma edição com o Daken, o filho do Wolverine. Agora estou trabalhando num novo título pra Marvel, com super-heróis conhecidos, que apareceram em filmes. Mas não sei se posso falar mais. É a primeira edição, então é melhor eu não falar nada. Vou ficar quietinha.
Você já tinha trabalhado com algum dos gêmeos antes?
Nunca. A gente se encontrava em convenções. E é muito engraçado ver os brasileiros se encontrando nessas convenções. Nós somos um público a parte. Quando nos encontramos, todo mundo é amigo - o Ivan Reis, o Joe Prado, o Renato Guedes. A gente faz uma festa por lá, as pessoas já percebem: “lá vêm os brasileiros’. Eu conheci os gêmeos nessas convenções. Mas foi uma grande surpresa quando eles entraram em contato comigo. Um dia eu estava feliz na minha casa, e o Gabriel me ligou me convidando para trabalhar. Eu achei o máximo, porque já tinha comprado a revista quando saiu em preto e branco. Achei muito legal.
Página de Casanova, desenhada por Fábio Moon. (Crédito: Marvel / Divulgação)
Como é seu processo de trabalho nessa série? É difícil pegar uma arte em preto e branco, que foi pensada para sair assim, e colorir?
Sabe, desde muito criança, eu tinha uma agonia de ver imagens em preto e branco. Meu brinquedo favorito eram aqueles livrinhos de colorir. Quando aprendi a mexer no Photoshop, para colorir meus próprios desenhos, acabei ficando sem nada para pintar, porque queria mais colorir do que desenhar. Então não foi difícil pra mim, parece que já penso colorido. O trabalho dos gêmeos, dos dois, funciona perfeitamente em preto e branco, mas eu sempre consigo imaginar uma corzinha em cima. E com a ajuda deles ficou ainda melhor. Eles me deram algumas referencias, fomos temperando as cores na revista.
Mas o contato com eles era no dia a dia da colorização?
Eles normalmente me sugerem uma paleta de poucas cores para usar. Porque, como esse trabalho tem todo um estilo mais antigo, um estilo anos 70, eles não querem que eu use todas as cores do Photoshop. Eles me indicam as que gostariam que eu usasse. Normalmente é uma paleta de 30, 40 cores. A partir daí, eu combino essas cores entre elas, e tenho de tomar cuidado para fazer mudanças no ambiente, para não usar as mesmas cores em todas as cenas. E é um trabalho bem mais complicado que escolher as próprias cores!
Mas, ao mesmo tempo, cria um resultado bem diferente, não? Dá todo um clima pra série...
Eu dou todo o crédito pros gêmeos quanto a isso, eles que deram essa ideia. Isso me instigou criativamente, é um trabalho que me desafia. Não é um arroz com feijão, eu tenho que quebrar a cabeça para contar a história e ainda deixar esteticamente bonito.
Sabe, desde muito criança, eu tinha uma agonia de ver imagens em preto e branco. Meu brinquedo favorito eram aqueles livrinhos de colorir. Quando aprendi a mexer no Photoshop, para colorir meus próprios desenhos, acabei ficando sem nada para pintar, porque queria mais colorir do que desenhar. Então não foi difícil pra mim, parece que já penso colorido. O trabalho dos gêmeos, dos dois, funciona perfeitamente em preto e branco, mas eu sempre consigo imaginar uma corzinha em cima. E com a ajuda deles ficou ainda melhor. Eles me deram algumas referencias, fomos temperando as cores na revista.
Mas o contato com eles era no dia a dia da colorização?
Eles normalmente me sugerem uma paleta de poucas cores para usar. Porque, como esse trabalho tem todo um estilo mais antigo, um estilo anos 70, eles não querem que eu use todas as cores do Photoshop. Eles me indicam as que gostariam que eu usasse. Normalmente é uma paleta de 30, 40 cores. A partir daí, eu combino essas cores entre elas, e tenho de tomar cuidado para fazer mudanças no ambiente, para não usar as mesmas cores em todas as cenas. E é um trabalho bem mais complicado que escolher as próprias cores!
Mas, ao mesmo tempo, cria um resultado bem diferente, não? Dá todo um clima pra série...
Eu dou todo o crédito pros gêmeos quanto a isso, eles que deram essa ideia. Isso me instigou criativamente, é um trabalho que me desafia. Não é um arroz com feijão, eu tenho que quebrar a cabeça para contar a história e ainda deixar esteticamente bonito.
E você é a primeira brasileira a concorrer ao Eisner?
Eu acho que sim. Eu nunca ouvi falar de uma mulher brasileira indicada ao prêmio. É claro que mulheres já foram indicadas. A Laura Martin, por exemplo, é uma colorista fantástica, que já ganhou o Eisner 2 vezes.
E como é o trabalho das mulheres nessa área? Você já sentiu alguma dificuldade?
Vou te dizer que nunca senti essa dificuldade. Mas é porque meu nome dá margem para confusão. Não foi de propósito que escolhi meu nome artístico: Cris Peter. Meu nome é mesmo Cristiane Peter, eu só encurtei para ficar mais fácil de pegar. Mas as pessoas normalmente pensam que Cris é um cara, e vários já se confundiram. Fui apresentada a muitos editores via email ou por outras pessoas que me conheceram pessoalmente. Como no inglês não tem muito gênero nas palavras, nem percebem que eu sou mulher.
Mas é comum ver mulheres como coloristas?
Sim. Tem gente que diz que as mulheres enxergam uma gama maior de cores, ou que têm tendência de combinar melhor as cores. Eu não sei se é verdade. Admiro vários coloristas homens, que fazem combinações de cores fantásticas. Mas existem várias mulheres na minha área. Tem a Laura Martin, tem a Rachelle Rosenberg. E tem uma moça que está concorrendo comigo, a Laura Allred, que também é ótima, com cores fantásticas. A mulherada está entrando nesse mercado, com o pé na porta.
Eu acho que sim. Eu nunca ouvi falar de uma mulher brasileira indicada ao prêmio. É claro que mulheres já foram indicadas. A Laura Martin, por exemplo, é uma colorista fantástica, que já ganhou o Eisner 2 vezes.
E como é o trabalho das mulheres nessa área? Você já sentiu alguma dificuldade?
Vou te dizer que nunca senti essa dificuldade. Mas é porque meu nome dá margem para confusão. Não foi de propósito que escolhi meu nome artístico: Cris Peter. Meu nome é mesmo Cristiane Peter, eu só encurtei para ficar mais fácil de pegar. Mas as pessoas normalmente pensam que Cris é um cara, e vários já se confundiram. Fui apresentada a muitos editores via email ou por outras pessoas que me conheceram pessoalmente. Como no inglês não tem muito gênero nas palavras, nem percebem que eu sou mulher.
Mas é comum ver mulheres como coloristas?
Sim. Tem gente que diz que as mulheres enxergam uma gama maior de cores, ou que têm tendência de combinar melhor as cores. Eu não sei se é verdade. Admiro vários coloristas homens, que fazem combinações de cores fantásticas. Mas existem várias mulheres na minha área. Tem a Laura Martin, tem a Rachelle Rosenberg. E tem uma moça que está concorrendo comigo, a Laura Allred, que também é ótima, com cores fantásticas. A mulherada está entrando nesse mercado, com o pé na porta.
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